terça-feira, 11 de novembro de 2008

O custo da qualidade – 2ª parte


O livro “Custo Aluno – Qualidade Inicial: rumo à educação pública de qualidade no Brasil” faz um debate sobre a presença do custo aluno qualidade na legislação brasileira recente.
Recentemente o Congresso Nacional comemorou os vinte anos de promulgação da Constituição atual. No seu artigo 211, parágrafo primeiro, está explícito o dever do Estado em estabelecer um padrão mínimo de qualidade para a educação oferecida aos brasileiros. E mais, está clara a necessidade que isso seja feito com a ajuda concorrente de todos os entes federados.
Art. 211....
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Em 1996 foi aprovada a Emenda Constitucional nº 14. Este dispositivo operou um descompromisso da União com o financiamento direto da União na educação básica e criou as condições para focalização dos recursos no ensino fundamental, em detrimento da educação infantil e do ensino médio. Porém, para conseguir maioria parlamentar para aprovar o Fundef, cuja constituição encontrava resistência de governadores, prefeitos e do movimento dos educadores, foi acordada uma redação que remetia para cinco anos depois o estabelecimento de condições para a existência de um padrão mínimo de qualidade. Isso ficou dito no parágrafo quarto do artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Art. 60....
§ 4º. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios ajustarão progressivamente, num prazo de cinco anos, suas contribuições no Fundo, de forma a garantir um valor por aluno correspondente a um padrão mínimo de qualidade de ensino, definido nacionalmente.

Este dispositivo foi solenemente ignorado durante os dez anos de sua vigência. Não foram promovidos debates acerca dos padrões mínimos de qualidade, nem foram ajustados progressivamente os valores do custo aluno de forma a alcançar a qualidade desejada.
Pior que isso, durante toda a vigência do Fundef os valores por aluno não respeitaram nem o que estava escrito na legislação que originou e que regulamentou o fundo. Isso ensejou que entidades do movimento educacional ingressassem junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental). Infelizmente o STF sempre foi muito ágil para soltar banqueiros bem relacionados, e muito lento para garantir os direitos fundamentais dos brasileiros, e o Fundef existiu durante dez anos sem que a União fosse obrigada a cumprir a lei que havia proposto e aprovado no Congresso Nacional.
Quando se iniciou a reformulação do modelo de financiamento da educação básica o debate acerca do padrão mínimo de qualidade foi apresentado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Foi apresentada uma emenda pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) para incorporar o dispositivo do custo aluno qualidade no novo texto constitucional. Mas a proposta não foi aceita e o teor do artigo 60 ADCT na Emenda Constitucional nº 53/06 ficou mais genérico e perdeu força a obrigação estatal com o estabelecimento do padrão mínimo de qualidade.

Art. 60.....
§ 1º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão assegurar, no financiamento da educação básica, a melhoria da qualidade de ensino, de forma a garantir padrão mínimo definido nacionalmente.

Mesmo assim a pressão social conseguiu recolocar o tema no texto da Lei nº 11.494/2007, que regulamentou o Fundeb. No seu artigo 38 foi introduzido que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão assegurar o padrão mínimo de qualidade e que o processo de definição deverá contar com a interferência da sociedade civil organizada.

Art. 38. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão assegurar no financiamento da educação básica, previsto no art. 212 da Constituição Federal, a melhoria da qualidade do ensino, de forma a garantir padrão mínimo de qualidade definido nacionalmente.
Parágrafo único. É assegurada a participação popular e da comunidade educacional no processo de definição do padrão nacional de qualidade referido no caput deste artigo


A cada lei é travada uma batalha para obrigar o Estado Brasileiro a estabelecer um padrão mínimo de qualidade. E na falta sistemática de iniciativas estatais para concretizar essa obrigação, é alvissareira a publicação do livro sobre custo aluno qualidade. É uma forma qualificada de pautar o debate e, quem sabe, fazer o Estado se mover.

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