segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Recesso

Depois de um ano inteiro de muito trabalho comunico que o blog estará de recesso até o dia 3 de janeiro.
Certamente que em 2011, com a tramitação do PNE, posse da presidenta Dilma e dos novos governadores, teremos muito que discutir.
Agradeço a todos os que acessaram e valorizam este espaço de debate educacional.
Feliz 2011 para todos!

Segunda parte dos comentários sobre a Mensagem do PL 8035/10

Uma das partes mais interessantes da exposição de motivos é a explicação sobre seu formato baseado em metas e estratégias.

O documento apresenta uma critica ao atual texto vigente, o qual está baseado no “tripé “diagnóstico - diretrizes - metas”, replicado nas diversas etapas e modalidades da educação”. Para o governo esta estrutura teve um duplo efeito: acentuou uma visão fragmentada e segmentada da educação e reforçou seu caráter programático, na “medida em que a multiplicação de metas para cada etapa ou modalidade da educação vem desacompanhada das estratégias necessárias para o cumprimento das metas”.

Como forma de resolver este problema, a nova versão de PNE optou pela adoção de um novo formato: “as metas foram reduzidas a vinte e se fizeram acompanhar das estratégias indispensáveis a sua concretização”.

Segundo o documento este formato permitirá que a sociedade tenha clareza das reivindicações a serem opostas ao Poder Público.

Por fim, o documento afirma que o governo não quer que o novo PNE se torne uma carta de boas intenções. Para isso, considera necessário “associar a cada uma das metas uma série de estratégias a serem implementadas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios em regime de colaboração”.

Este arrazoado não é muito convincente, ou pelo menos o texto não consegue representar as intenções expostas no documento introdutório. Senão vejamos:

1. É verdade que foram feitos alguns estudos diagnósticos, mas o texto estruturado em metas e estratégias não esclarece quais parâmetros comparativos deverão ser utilizados para o seu cumprimento. Ter um extenso diagnóstico não foi o principal problema do plano anterior;

2. O documento levanta uma preocupação relevante quanto a necessidade de controle social sobre o plano. Isso não existia no plano anterior e me parece um avanço;

3. Li o texto e raramente é possível conferir a praticidade de que ao definir metas e estratégias o documento estabeleceu com clareza as responsabilidades entre os entes federados. Pelo contrario, esta é para mim uma das maiores ausências do documento enviado ao Congresso. Na verdade está implícito que o documento trabalhou com a realidade atual, ou seja, com as responsabilidades que constam da Constituição, mas isso não foi suficiente para garantir o regime de colaboração entre os entes, correndo-se o risco de sobrecarregar determinado ente (os municípios na universalização da pré-escola, por exemplo) e não garantir distribuição de responsabilidades e formas de apoio dos outros entes.

É muito necessário que se agregue a cada estratégia a competência de realizá-la e o papel dos demais entes no apoio aquela dada tarefa concreta.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Breves comentários sobre a Mensagem do PL 8035/10

Ao encaminhar o Projeto de Lei nº 8035/10, que aprova o Plano Nacional de Educação, o Presidente da República enviou como mensagem a Exposição de Motivos redigida pelo MEC.

É um texto longo, possuindo 17 páginas, por isso apresento aqui apenas alguns breves comentários sobre trechos que me chamaram a atenção.

1. É, obviamente, um texto otimista em relação às realizações do atual governo. Diz que “os indicadores mais recentes confirmam o alcance de bons resultados em quase todos os níveis e dimensões da educação”. Infelizmente não é verdade! Mas como o texto coloca um “quase”, o governo pode afirmar que os maus resultados em algumas áreas estão incluídos na ressalva.

2. Em seguida afirma que para vencer a batalha de melhoria da educação é necessário um “tratamento da educação como política de Estado, com planejamento sistemático e de longo prazo”. Concordo plenamente. Este é um desafio grandioso, que ultrapassa a simples aprovação de um novo PNE, mas depende da vontade política do governo em ter o novo plano como espinha dorsal de suas políticas educacionais.

3. Na parte denominada “antecedentes” há uma clara visão por demais elogiosa das políticas anteriores, como se tudo fosse uma eterna continuidade sem conflitos. Exemplo disso é o comentário sobre o FUNDEF, que é descrito como algo que implementou “importante mecanismo de redistribuição de recursos vinculados à educação com vistas a cumprir o princípio constitucional da equalização do financiamento”.

4. Há um capítulo para descrever a importância do PDE. Nele é relativizado o elogio ao FUNDEF. Afirma que sob “o discurso de universalização do ensino fundamental, por exemplo, criou-se a indesejável oposição entre educação básica e superior. Diante da falta de recursos, caberia ao gestor público optar pela primeira. Sem que a União aumentasse o investimento na educação básica, o argumento serviu de pretexto para asfixiar o sistema federal de educação superior e inviabilizar a expansão da rede”. Concordo com a critica formulada, mas ela foi exposta para poder afirmar em seguida que no atual governo o problema do investimento na educação foi resolvido.

5. A afirmação mais preocupante é quando o texto, mesmo admitindo que o PDE não foi criado tendo por base o PNE, afirma que ele foi decisivo para o seu cumprimento. Diz o texto: “Apesar de não ser a tradução direta do PNE, o PDE - como conjunto de programas e ações destinadas à melhoria da educação, acabou por constituir-se em importante instrumento para persecução das metas quantitativas estabelecidas naquele diploma legal”.

6. Ressalta que a realização das Conferências Educacionais foi importante para que o texto do novo PNE existisse. Não acho que o texto enviado expressa a riqueza destes movimentos realizados pela sociedade civil, mas admitir a influência é importante, mesmo que seja para no Congresso cobrar a coerência entre o afirmado e o conteúdo do texto enviado.

7. Há um longo trecho tentando sintetizar as principais contribuições da CONAE ao processo de elaboração. Achei que a redação só reforça a contradição entre a riqueza das contribuições versus a fragilidade das metas e estratégias. Exemplo disso é quando resgata que a CONAE enxergava que o regime de colaboração deveria estar ancorado “ na perspectiva do custo aluno/qualidade (CAQ)”. Basta ler a única linha sobre o assunto (Estratégia 20.5) para ver que o resgate foi mera formalidade, pelo menos como regra.

Amanhã continuo os comentários, pois o texto é longo.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

PNE começa a tramitar


Após cinco dias do anúncio oficial, o Projeto de Lei nº 8035/10, que Aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio 2011-2020 e dá outras providências, começa a tramitar na Câmara dos Deputados.

A Mesa Diretora distribuiu o Projeto para três Comissões: Educação e Cultura, Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania.

A Comissão de Educação e Cultura designou a deputada Fátima Bezerra (PT-RN) como relatora. A deputada foi relatora da Emenda Constitucional nº 53/06, que instituiu o FUNDEB e teve uma boa relação com os movimentos sociais da educação.

Segundo o Portal da Câmara, a proposição está sujeita à apreciação conclusiva pelas Comissões.

O Prazo para apresentação de Emendas ao Projeto é de 5 sessões ordinárias a partir de 23/12/2010, mas certamente começará a contar apenas de sessões da próxima legislatura, pois só está prevista para acontecer este ano uma Sessão do Congresso para aprovar o Orçamento de 2011.

Para acessar o Projeto de Lei na íntegra basta acessar o link abaixo:

http://www.camara.gov.br/sileg/integras/831421.pdf

Uma boa indicação


Um dos esforços que preciso fazer em 2011 é acompanhar de forma mais decidida à política do Distrito Federal. Estou na capital federal desde janeiro de 2003, mas ainda não consegui me entrosar com o cotidiano, seja por viajar constantemente, seja pelos laços políticos com o Pará.

As eleições de 2010 foram as primeiras que contaram com meu voto em candidatos do DF. Votei no primeiro turno em Toninho (PSOL), que foi a grande surpresa do pleito, representando a coerência e a verdadeira mudança, sem acordos com o passado. Portanto, não fui eleitor do governador eleito Agnelo Queiroz.

Todos os dias tenho lido matérias sobre as indicações do novo secretariado do DF. Assusta-me, sobretudo a entrega da área de obras para o PMDB local, procedimento que inevitavelmente levará a novos escândalos financeiros em futuro próximo.

Mas queria registrar a minha felicidade ao ler o nome da futura Secretária de Educação. O governador eleito convidou a professora da UNB Regina Vinhaes Gracindo.
Natural do Rio de Janeiro/RJ fez Pedagogia e Mestrado em Educação na UnB (Currículo -1982 e Planejamento Educacional - 1987) e Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (1993). Foi professora de educação infantil, ensino fundamental e médio, diretora de escola e assessora pedagógica da SEE - DF.

É professora da FE/UnB, onde já foi chefe de departamento, coordenadora do Curso de Especialização em Administração da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação. Como pesquisadora, desenvolve estudos na área de políticas e gestão da educação, tendo como temas preferenciais: Educação e Partidos Políticos - Políticas Públicas de Educação - Gestão da Educação.

Conheci Regina nos embates do processo constituinte de 1988, engajada na luta por uma escola pública de qualidade. Reencontrei com ela nas Conferências da sociedade civil que produziram o Plano Nacional de Educação da Sociedade Civil no final de 2000.

Quando cursei o meu mestrado na UNB a professora Regina coordenava a Pós-graduação daquela universidade. E voltamos a conversar nos debates sobre o Custo-aluno Qualidade no Conselho Nacional de Educação.

Certamente com Regina a educação do Distrito Federal estará em ótimas mãos.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Análise do Novo PNE - META Nº 1

Continuando o meu esforço de análise do Projeto de PNE do governo federal, hoje comento a primeira meta do novo plano.

Meta 1: Universalizar, até 2016, o atendimento escolar da população de 4 e 5 anos, e ampliar, até 2020, a oferta de educação infantil de forma a atender a 50% da população de até 3 anos.

Aqui aparecem duas metas. A primeira, que diz respeito à universalização do atendimento na pré-escola, transcreve para o PNE as obrigações inscritas na Constituição Federal pela Emenda nº 59. Ou seja, até 2016 os municípios devem conseguir incluir 1 milhão 400 mil crianças de quatro e cinco anos.

A segunda parte da meta estabelece que em 2020 deve-se atingir a meta que deveria ter sido alcançada em 2010, garantindo vaga para 50% da população de até 3 anos de idade.

Esta segunda parte está em desacordo com o que foi aprovado na CONAE sobre o tema.
No documento final da Conferência está escrito:

A garantia de aporte financeiro do Governo Federal para a construção, reforma, ampliação de escolas e custeio com pessoal, para aumento da oferta de vagas em 50%, até 2010, e a universalização do atendimento à demanda manifesta, até 2016, especificamente às crianças da faixa etária de 0 a 3 anos de idade, em período integral, a critério das famílias, assegurando progressivamente seu atendimento por profissionais com nível superior e garantia de formação continuada (p. 68).

A CONAE propôs que até 2016 fosse universalizado o atendimento da “demanda manifesta” em creche. Em 200 o percentual de cobertura era de 9,4% e a proposta era chegar a 50% depois de 10 anos. Pela PNAD de 2009 o percentual de cobertura não chegou a 20%.

Na decisão da CONAE ficou clara a preocupação de que a União devesse ter uma significativa participação neste esforço. No texto enviado ao Congresso Nacional a participação de cada ente federado é genérica, remetendo para futura definição, portanto, em instrumento posterior a aprovação da Lei.

1.1) Definir, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, metas de expansão das respectivas redes públicas de educação infantil segundo padrão nacional de qualidade compatível com as peculiaridades locais.

Como a obrigação constitucional é municipal, sem que o Plano inscreva claramente qual é a participação da União e dos Estados neste esforço de inclusão das crianças pequenas, certamente a pressão ficará resumida na esfera municipal.

Na estratégia 1.2 o texto apresenta a proposta genérica de manutenção do atual programa Proinfância. Mesmo que proponha “aprofundar”, não são estabelecidos patamares para mensurar este aprofundamento, sendo impossível monitorar o seu cumprimento, principalmente quando todos sabem que o desempenho deste programa ficou a desejar no período anterior.

1.2) Manter e aprofundar programa nacional de reestruturação e aquisição de equipamentos para a rede escolar pública de educação infantil, voltado à expansão e à melhoria da rede física de creches e pré-escolas públicas.

Cabe modificar totalmente estes itens. Em primeiro lugar, para cumprir a meta proposta pela CONAE. Em segundo lugar, para definir claramente o tamanho do esforço dos entes federados, especialmente da União. Nem a meta de 6000 novas unidades de educação infantil construídas com financiamento federal em quatro anos, que consta do Programa de Governo da Presidenta Eleita consta do texto.

Vale lembrar que construção de 1500 unidades por ano representa apoiar a incorporação de 180.000 novas crianças na rede pública, sendo que parte é destinada a pré-escola. E em nenhum dos anos anteriores o governo federal conseguiu chegar à metade desta meta.

Porém, o que mais chama a atenção do texto relativo à META 1 é o disposto na estratégia 1.4, pois contraria frontalmente um dos principais debates ocorridos na CONAE.

O texto diz:

1.4) Estimular a oferta de matrículas gratuitas em creches por meio da concessão de certificado de entidade beneficente de assistência social na educação.

Atualmente, por força da Lei nº 11.494/07, é permitido à contabilização de vagas oferecidas por entidades comunitárias e filantrópicas no atendimento de creche e educação especial. A contagem para pré-escola foi válido durante os quatro primeiros anos de vigência do FUNDEB.

O texto propõe que um dos eixos de crescimento da oferta de vagas em creche seja o estímulo do Poder Público a oferta de matrículas em entidades privadas sem fins lucrativos. Em primeiro lugar, estímulo significa financiamento público ou, na melhor das hipóteses, isenções fiscais. Em segundo lugar, as matrículas de creche, pelos dados de 2009, já são o segmento mais privatizado da educação básica. Na área privada (comercial ou filantrópica) tínhamos 40,9% das matrículas existentes.

A CONAE, depois de intenso debate deliberou uma proposta que vai ao caminho inverso ao escolhido pelo governo federal.

Contudo, em respeito ao princípio do recurso público para a escola pública, o número de matrículas em creches conveniadas deve ser congelado em 2014, e essa modalidade de parceria deve ser extinta até 2018, tendo que ser obrigatoriamente assegurado o atendimento da demanda diretamente na rede pública. (P.113)

Ou seja, para a CONAE o que está escrito na Lei do FUNDEF deveria ser abreviado. Para o governo federal, esta lógica deve ser ampliada.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A volta dos que não foram?

Tenho comentado várias vezes que um dos problemas do governo Lula é não ter realizado uma ruptura com as idéias do governo anterior. Essa premissa também se faz presente na educação, mesmo que tenham ocorridos pequenas rupturas, infelizmente as continuidades são mais fortes.

Volto a falar do tema por que a Revista Época divulgou no dia de hoje alguns pontos de um documento elaborado por doze educadores. O documento foi elaborado por personalidades ligadas ao governo FHC, defensores do caráter regulador do Estado Brasileiro e interlocutores do setor privado. Destaco a presença de são Cláudio de Moura e Castro, , Luiz Carlos Menezes, Maria Helena Guimarães de Castro, Guiomar Namo de Mello, Mozart Neves, Eunice Ribeiro Duhran e Ruben Klein.

E que idéias estas pessoas lançaram ao vento? As mais polêmicas foram:

1. Congelamento das atuais carreiras do magistério, priorizando a progressão pela meritocracia, “fazendo com que o professor seja avaliado conforme o desempenho de seus alunos e seja passível de punição em caso de faltas recorrentes”.

2. Reforma das faculdades de educação e dos currículos usados por ela.

3. Campanha de marketing para recuperar a imagem da profissão na sociedade brasileira.

4. Mais poder para que os diretores controlem os rumos de suas escolas.

5. Criar a possibilidade de que a iniciativa privada cuide da gestão de escolas públicas.

6. Implantar um exame de saída do ensino médio, que no futuro servirá de base para a disputa de vagas nas universidades.

7. Currículo nacional unificado.

8. Avaliação nacional no terceiro ano do ensino fundamental, para monitorar o analfabetismo, e aprofundar a cultura de medição de desempenho, melhorando exames já existentes como o Ideb e a Prova Brasil.

9. Rever o uso do Fundeb, permitindo repasse para organizações privadas que administrem escolas e redes de ensino público.

Acho plenamente legítimo que todos os setores sociais (conservadores, neoliberais remanescentes e privatistas de toda ordem) exponham suas idéias. Gostaria que documentos elaborados pelos setores progressistas tivessem o mesmo espaço na mídia (é pedir demais?).

O que me preocupa não são as idéias deste grupo, mas o terreno fértil que podem encontrar no governo Dilma e na gestão Haddad.

Isto me preocupa!

Haddad vai continuar no MEC. E daí?


Depois de longa espera e muita especulação a presidenta eleita Dilma Rousseff anunciou ontem à noite que Fernando Haddad permanecerá no comando do Ministério da Educação.

Sem contato com interlocutores que tenham participado do processo de escolha e, por outro lado, tendo apenas disponíveis as informações da mídia, não me aventuro a especular os motivos reais da permanência. A montagem de um governo é um jogo de xadrez, no qual pesam mais os interesses partidários, as coalizões, do que propriamente um minucioso balanço de gestão anterior, mesmo que um desempenho sofrível tira da disputa qualquer ministro.

Neste sentido o atual presidente, que durante oito anos teve três ministros na área da educação, não pode reclamar da gestão de Fernando Haddad. Tentando olhar pela ótica lulista, quais foram seus méritos?

1. Acelerou o processo de ampliação de vagas no ensino superior, tendo por base o Prouni e o Reuni. Conseguiu hegemonizar a área acadêmica, oferecendo concessões em troca de apoios ao seu modelo de expansão.

2. Conseguiu, mesmo com o vazamento da prova ano passado e as trapalhadas da prova deste ano, transformar o ENEM em vestibular nacional unificado. O que era uma marca do governo FHC se transformou em marca do governo Lula.

3. Com o FUNDEB em vigor conseguiu diminuir as tensões com estados e municípios.

4. Lançou o PDE sem saber direito o que era, mas foi dotando a marca de conteúdo e com o lançamento do IDEN emplacou um novo indicador, pautando a imprensa e as redes estaduais e municipais.

5. Realizou a Conferência Municipal de Educação e criou uma dinâmica de participação que impediu uma reação mais radical aos limites do projeto de novo Plano Nacional de Educação.

6. Foi sempre um ministro obediente publicamente ao chefe, virtude muito valorizada por Lula.

Os nomes que circularam nos bastidores para substituir Haddad, especialmente do carismático Chalita, também ajudaram na sua permanência.

Só saberem os o preço que Haddad teve que pagar em termos de concessões a bancada petista da educação, que não via sua permanência com bons olhos, no início de janeiro, quando o Diário Oficial começar a publicar as novas nomeações para os principais órgãos do MEC.

De qualquer forma, olhando pelo lado prático, os educadores já sabem o que esperar do MEC na nova gestão.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Comentários sobre Projeto de PNE – 2ª parte

Como todo plano nacional de educação, o projeto de lei enviado pelo governo federal possui uma parte legal propriamente dita e um anexo onde são descritas as metas e estratégias.

O corpo da lei é composto de 12 artigos. Hoje farei breves comentários sobre os principais artigos.

A primeira observação diz respeito ao artigo 2º. Neste artigo estão descritas as diretrizes do Plano Nacional. Não tenho questionamentos sobre a relevância das dez diretrizes, com destaque para a importância de erradicar o analfabetismo, universalizar o atendimento escolar ou valorizar o magistério. Contudo, a diretriz de número 10 foi redigida da seguinte forma: “difusão dos princípios da equidade, do respeito à diversidade e a gestão democrática da educação”. Considero que não cabe ao plano nacional ter como diretriz apenas a difusão da equidade e sim apresentar mecanismos garantidores dela. O mesmo vale para a gestão democrática, que nas metas é induzida e não difundida.
Identifico um problema no arti
go 4º, onde é dito que o plano terá como referência os censos educacionais mais atualizados, o que em termos de monitoramento é uma obviedade. Poderiam ser acrescidos os dados das PNADS, por exemplo, e ainda assim estaríamos no mesmo terreno. O que faz falta é a existência de um Anexo com o diagnóstico que orientou o estabelecimento das metas e estratégias.

Infelizmente o projeto de lei não está acompanhado de pelo menos um resumo executivo de pesquisa encomendada pelo MEC e realizada em 2009. Neste trabalho coordenado pelo professor Luiz Dourado (UFG). Na introdução do primeiro volume (são três volumes e 784 páginas) é dito que a pesquisa esteve “sob a coordenação e supervisão da Secretaria Executiva Adjunta (SEA), por designação do Ministro de Estado da Educação, com o expressivo apoio do Inep”. Por que não consta do texto legal os fundamentos empíricos que levaram a opção pelas metas e estratégias? Ficará difícil fazer um juízo de valor se determinada meta é factível ou não sem estes elementos.

O artigo 5º já está gerando pelo menos duas interpretações. No texto é dito que a “meta de ampliação progressiva do investimento público em educação será avaliada no quarto ano de vigência dessa Lei, podendo ser revista, conforme o caso, para atender às necessidades financeiras do cumprimento das demais metas do PNE - 2011/2020”.

A Emenda Constitucional nº 59, ao alterar o inciso VI do artigo 214 da Carta Magna tornou obrigatória tal definição. O texto constitucional coloca como obrigatório que conste da Lei do PNE o “estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto”. Portanto, a CF remete para uma lei tal definição. Uma leitura possível da redação do artigo proposto é que o Congresso delegará ao governo a possibilidade de revisar a meta aprovada. Ora, a Constituição não autoriza tal subdelegação e uma revisão pode ser para aumentar (como afirmou o Ministro da Educação no dia de ontem) ou para diminuir (uma crise fiscal pode forçar ajustes drásticos, por exemplo). E quem fará tal ajuste não fica claro na redação do artigo.

Um dispositivo muito interessante é o que consta do artigo 6º. Está escrito:

Art. 6º. A União deverá promover a realização de pelo menos duas conferências nacionais de educação até o final da década, com intervalo de até quatro anos entre elas, com o objetivo de avaliar e monitorar a execução do PNE – 2011-2020 e subsidiar a elaboração do Plano Nacional de Educação para o decênio 2021-2030.

Parágrafo único. O Fórum Nacional de Educação, a ser instituído no âmbito do Ministério da Educação, articulará e coordenará as Conferências Nacionais de Educação previstas no caput.


É uma incorporação de uma das principais propostas da CONAE. Ter nas Conferências Nacionais de Educação, coordenadas por um Fórum Nacional de Educação é uma medida democratizadora e de controle social importante.

Apenas vislumbro um problema: faltam metas intermediárias no plano, situação que dificultará a definição de critério técnico para julgar o quanto o plano está sendo cumprido daqui a quatro anos. Várias metas enfrentarão esta dificuldade. Por exemplo, a meta 12 propõe que seja elevada a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta”. Quanto deve ser alcançado em quatro anos para que se considere que o plano está sendo cumprido?

Como que justificando a pouca concretude do quesito “regime de colaboração” no Anexo de metas, o parágrafo 1º do artigo 7º afirma que as estratégias definidas na Lei “não elidem a adoção de medidas adicionais em âmbito local ou de instrumentos jurídicos que formalizem a cooperação entre os entes federados”. Este parágrafo é redundante em relação ao que já foi escrito na Constituição Federal em 2006 (Emenda nº 53). O que se precisa é de mais solidez no texto do plano sobre como serão divididas as responsabilidades para que sejam alcançadas as metas propostas.

No artigo 8º é estabelecido o prazo de um ano para a elaboração de planos estaduais e municipais, sendo que a lei permite que sejam apenas adaptados planos recentemente aprovados pelos entes federados. Esta redação é bem mais precisa do que a do plano anterior.

Uma novidade interessante é a obrigação de que os estados, distrito federal e municípios aprovem leis disciplinando a gestão democrática no prazo de um ano. Nas metas será estabelecida a comprovação do cumprimento desta meta como pré-requisito para receber transferências voluntárias do governo federal, o que é um poderoso instrumento de indução ao cumprimento deste dispositivo.

Considero que no artigo 11 há uma grande ausência, que será sentida no decorrer do texto do Anexo de Metas. O custo aluno-qualidade (CAQ), que foi um eixo transversal das deliberações da CONAE, simplesmente sumiu do Plano Nacional de Educação. Aparece claramente no final do Anexo, apenas para registrar que o governo terá 10 anos para estabelecê-lo. E poderia ter sido aproveitado o artigo 11, que trata do IDEB e delega ao INEP a construção de “outros indicadores de qualidade relativos ao corpo docente e à infra-estrutura das escolas de educação básica”, para estabelecer um prazo para a consolidação do CAQ.

Amanhã começarei a comentar as metas e estratégias, parte mais significativa do Plano.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Nota da Campanha Nacional sobre o PNE

Nota à Sociedade Brasileira

Leitura inicial do projeto do Executivo Federal para o PNE 2011-2020


Brasília, 15 de dezembro de 2010.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, como membro titular da Conae (Conferência Nacional de Educação), esteve presente na solenidade de lançamento da proposta de projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) 2011-2020 ocorrida hoje, há poucas horas, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Segundo informações veiculadas pela imprensa, o evento estava previsto para ocorrer apenas em 27 de dezembro. No entanto, no dia 8 de dezembro, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação manifestou por meio do Posicionamento Público “A educação não pode esperar: contra o atraso do Executivo Federal na divulgação de sua proposta de PNE 2011-2020” sua contrariedade com a escolha desta data, espremida entre as festas de fim de ano e às vésperas da conclusão do mandato do Presidente Lula. Graças à pressão da sociedade civil, somada à sensibilidade de gestores públicos do próprio governo federal, foi acertadamente adiantada a data da atividade solene.

A partir da divulgação do documento pelo Poder Executivo, as considerações apresentadas nesta Nota são resultado de uma primeira leitura.

O texto prioriza a valorização do magistério, o que é positivo. Considerando que o PNE é o fio condutor da política educacional em âmbito federativo, devendo englobar e articular adequadamente os níveis federal, estadual, distrital e municipal – conforme sua missão constitucional estabelecida pelo Art. 214 –, melhorar as condições de trabalho e remuneração dos docentes é um importante passo.

Contudo, para valorizar efetivamente a carreira docente, são necessários investimentos adequados em educação. Da forma como está proposto no projeto do Executivo, até 2020 o Brasil deve alcançar o patamar de investimentos públicos na ordem de 7% do PIB. No entanto, no sentido de criar meios reais para universalizar o direito de acesso à educação de qualidade, a Campanha insistirá na sensibilização dos parlamentares e do Poder Executivo para que os 7% do PIB sejam alcançados em, no máximo, quatro anos, a partir do início da vigência do PNE. Vale lembrar que durante o processo eleitoral a presidente eleita, Dilma Rousseff, prometeu alcançar esse patamar até 2014. A comunidade educacional reivindica, há anos, investimentos públicos na ordem de 10% do PIB. A Conae reafirmou esse valor.

O Art. 5º do Projeto de Lei do Executivo Federal para o PNE 2011-2020 propõe que em 4 anos a “meta de ampliação progressiva do investimento público em educação seja avaliada”. Um mecanismo capaz de orientar essa avaliação é o CAQ (Custo Aluno-Qualidade). Desenvolvido e proposto pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o CAQ determina, por meio de uma planilha de insumos educacionais, o quanto precisa ser investido para que uma educação básica pública de qualidade seja oferecida a todos os cidadãos e cidadãs em território nacional. Incorporado pelo CNE (Conselho Nacional de Educação), o CAQ foi maciçamente aprovado na Conae, chegando a ser tratado como a referência sobre a qual deve ser estruturada a política de financiamento para o estabelecimento do Regime de Colaboração (Documento Final da Conae, pág. 23).

Embora toda legitimidade e reconhecimento conquistado pela proposta, a negociação no interior do Executivo Federal reduziu o mecanismo do CAQ a uma estratégia que propõe sua definição em 10 anos, o que é excessivamente tímido: “20.5) Definir o custo aluno-qualidade da educação básica à luz da ampliação do investimento público em educação.” De antemão, a Campanha defende que a estratégia deveria ser, ao menos, “20.5) Implementar o custo aluno-qualidade da educação básica como instrumento para a ampliação adequada do investimento público em educação”.

Na mesma linha, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e as entidades do movimento estudantil (UNE e Ubes) lideraram na Conae a aprovação de uma emenda que propunha a destinação de 50% dos recursos advindos da exploração da camada Pré-Sal para a educação, por meio de uma vinculação imediata desses recursos ao orçamento do MEC. Segundo a proposta, desse total acumulado, 30% deveriam ficar com a União, para o desenvolvimento de programas relativos ao ensino superior, e 70% deveriam ser transferidos a estados, Distrito Federal e municípios, para o desenvolvimento de programas de educação básica por meio de uma política de transferências equivalente ao salário educação. Segundo a proposta, deveriam ser priorizados os estados e municípios com baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). No entanto, o texto propõe como estratégia apenas: “20.3) Destinar recursos do Fundo Social ao desenvolvimento do ensino.”

A meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do PIB e a forma como vão ser tratadas as estratégias do CAQ e da incorporação dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal pelas políticas educacionais servem como um termômetro para medir o grau de prioridade que será dado ao PNE e, conseqüentemente, à educação, pela sociedade e pelo Estado brasileiro. É consenso que o principal motivo do fracasso do PNE 2001-2010 deveu-se, marcadamente, aos vetos apostos a metas de financiamento da educação empreendidos pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e mantidos pelo presidente Lula.

Orientada pelos aportes da Conae, a proposta de PL do PNE 2011-2020 parte de um patamar mais ambicioso, mas que pode e deve ser superado no âmbito do Congresso Nacional. Como é costume, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação analisará coletivamente o texto e buscará no conjunto dos seus 12 artigos, das suas 20 macro-metas e mais de 170 estratégias aquilo que pode ser aprimorado ou incluído.

No âmbito das demais metas e estratégias propostas no projeto do Executivo, chama a atenção a meta 1 e a correspondente estratégia “1.4) Estimular a oferta de matrículas gratuitas em creches por meio da concessão de certificado de entidade beneficente de assistência social na educação”. Da forma que está colocado, subentende-se que o conveniamento entre poder público e entidades privadas sem fins lucrativos será estimulado para o atendimento de educação infantil da faixa etária de 0 a 3 anos, muito diferente do que foi aprovado na Conae. Aliás, a própria meta de matricular 50% das crianças nessa faixa etária é tímida. No mínimo, o Brasil deveria buscar meios para avançar para 70% de matrículas.

Seguindo a mesma linha, uma das preocupações iniciais da Campanha é com a definição no texto legal do papel e das responsabilidades de cada ente federado. Essa, a propósito, é uma das missões do PNE, segundo o Art. 214 da Constituição Federal. A Conae teve como tema principal o estabelecimento do Sistema Nacional de Educação, que pressupõe a regulamentação do regime de colaboração. Com base nas deliberações da Conferência, é preciso que a tramitação no Congresso Nacional busque determinar meios e responsabilidades da União, dos estados e dos municípios.
Com esta Nota, o objetivo da Campanha não é outro senão começar seu trabalho de incidência no PNE. O objetivo é colaborar para a construção de um Plano robusto e efetivamente capaz de orientar a execução das políticas educacionais na próxima década. Tal como ocorreu na criação e regulamentação do Fundeb, quando a Campanha coordenou o movimento “Fundeb pra Valer!” – decisivo para a inclusão das creches e para a definição de uma importante (ainda que insuficiente) complementação financeira da União ao novo fundo –, a idéia é reunir entidades e movimentos da sociedade civil para, com os parlamentares sensíveis à causa, buscar meios políticos a fim de superar os limites comumente impostos pela área econômica do Governo Federal.

Desse modo, tomando como base as deliberações da Conae, a incidência da Campanha Nacional pelo Direito à Educação priorizará a superação dos limites do projeto apresentado hoje pelo Executivo Federal, entre eles: a ausência de delimitação de atribuições entre entes federados para o cumprimento de cada uma das metas, ficando praticamente centrada nas competências próprias da União; a repetição de metas quantitativas e qualitativas presentes no PNE atual – por exemplo, no caso das creches; a ausência de uma definição efetiva do custo aluno-qualidade como parâmetro básico de financiamento, maior investimento público em educação e ausência de metas intermediárias que permitam o monitoramento de progressos.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação entende que a educação brasileira não pode aceitar menos que um “PNE pra Valer!”.

Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Organizações que compõem o Comitê Diretivo da Campanha
Ação Educativa
ActionAid Brasil
Cedeca-CE (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará)
Centro de Cultura Luiz Freire – PE
CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação)
Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente
Mieib (Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil)
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação)
Uncme (União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação)

A montanha pariu um rato

Nesta manhã cinzenta de Brasília, no Palácio do Planalto, o presidente Lula, ladeado do atual Ministro da Educação Fernando Haddad, apresentou a proposta de Plano Nacional de Educação para os próximos dez anos.

Havia forte expectativa em relação ao teor do texto, que se justificavam por se tratar de um plano elaborado por um governo considerado de esquerda (mesmo que isso conceitualmente e programaticamente não seja consensual!), forçando comparação imediata com o conteúdo do projeto apresentado pelo seu antecessor (FHC). Também havia forte esperança de que o texto “bebesse na fonte” das deliberações da Conferência Nacional de Educação, evento que mobilizou grande parcela dos educadores e foi finalizado com a etapa nacional em abril passado.

As expectativas estavam vinculadas também a necessidade de superação dos enormes desafios educacionais, especialmente depois da fraca execução do plano anterior.
Infelizmente a primeira impressão (fruto de uma primeira leitura do texto composto de vinte metas, 170 estratégias e 12 artigos iniciais) não é positiva, por isso o provocativo título desta postagem.

Pretendo realizar um exaustivo trabalho de análise do texto, mas adianto algumas observações iniciais:

1ª. Ao contrário do PNE anterior, este não veio acompanhado de um diagnóstico da situação educacional até 2010. Pelo que eu sei este trabalho foi encomendado a especialistas e realizado. Deveria seguir com anexo, pois é com base no diagnóstico que podemos verificar se uma meta é factível, aceitável ou se porventura apresenta um formato tímido.

2ª. Houve polêmica sobre o tamanho que deveria ter o novo PNE, ficando claro que o governo optou por um PNE mais conciso. Não tenho nada contra em princípio ao formato apresentado. O problema que detectei é outro. O texto do novo PNE não possui, como regra, metas intermediárias, sendo contraditório com a proposta colocada no seu artigo 6º, que estabelece a realização de duas conferências nacionais para avaliar a execução do plano. Como avaliar se o desempenho é positivo se não está dito o quanto deveria ter sido alcançado nos quatro ou cinco primeiros anos? A exceção é a meta 9, que trata da erradicação do combate ao analfabetismo.

3ª. Fala-se muito no texto em regime de colaboração, mas pouco se efetiva as responsabilidades de cada ente federado. Em alguns momentos fico com a impressão de que o texto é um plano federal de educação, pois a verbo sempre é “induzir”, “fomentar”, “propor”, como se o plano estivesse direcionado a ajudar os estados e municípios a cumprir suas obrigações. Este certamente foi um problema do plano anterior e parece se repetir neste. O único momento em que a questão é formatada é na meta 17, que institui um fórum com entes federados e trabalhadores para acompanhar salário dos docentes.

4ª. A parte que deveria ser a mais forte, inexplicavelmente é a mais fraca. O Plano anterior sofreu com os vetos do FHC a sua parte financeira. Este está melhor, induzido pela Emenda 59, que obriga escrever o percentual de aplicação dos recursos educacionais em relação ao PIB, e pelas deliberações da CONAE, o projeto apresenta a projeção de aumento progressivo do gasto público em educação para alcançar 7% do PIB em 2020. Isso é positivo, mas pouco, senão vejamos:

4.1. Em 2001 o parlamento propôs que este fosse o gasto em 2010, ou seja, estamos prorrogando por mais dez anos a mesma meta não alcançada.

4.2. Na época a sociedade civil reivindicava 10% e na CONAE foi aprovado este percentual maior. O governo federal desconsiderou tal proposta.

4.3. No seu artigo 5º há uma brecha (uma avenida!) para o seu descumprimento. Lá está dito que esta meta deve ser avaliada após quatro anos de vigência. Os otimistas dirão que esta revisão será para aumentar. Será? Não é dito quem irá avaliar, podendo representar uma autorização legislativa para que o governo federal altere o principal aspecto do plano sem consulta, por exemplo.

4.4. E o mais grave, o documento não diz quem vai pagar a conta. Ou seja, precisamos saltar (mesmo que um pequeno salto em relação às necessidades educacionais!) de 5% em 2009 para 7% em 2020. Para isso é necessário mais recursos, obviamente. De onde sairão os recursos? Quem contribuirá e com quanto?

5ª. O texto governamental conseguiu a proeza de praticamente “sumir” com uma das principais inovações da CONAE, que foi o estabelecimento do Custo Aluno-qualidade como referência para o financiamento. A palavra só aparece na estratégia 20.5, adiando sua efetivação para o final da segunda década deste novo século. E, sem citar o nome, na estratégia 7.19.

Durante toda a semana comentarei neste espaço cada meta e suas respectivas estratégias.

Meu sentimento inicial é de frustração com o texto. Não que ele não seja melhor em muitos aspectos ao anterior. Mas ele está muito aquém do acúmulo conseguido na CONAE.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O contragolpe no Grande Irmão

Por Umberto Eco, no Libération


O caso WikiLeaks tem uma dupla leitura. Por um lado, revela-se um escândalo aparente, um escândalo que só escandaliza por causa da hipocrisia que rege as relações entre os Estados, os cidadãos e a Comunicação Social. Por outro, anuncia profundas alterações a nível internacional e prefigura um futuro dominado pela recessão.

Mas vamos por partes. O primeiro aspecto revelado pelo WikiLeaks é a confirmação do fato de cada processo constituído por um serviço secreto (de qualquer nação) ser composto exclusivamente por recortes de jornal.

As “extraordinárias” revelações norte-americanas sobre os hábitos sexuais de Berlusconi apenas relatam o que há meses se anda a ler em qualquer jornal (exceto naqueles de que Berlusconi é proprietário), e o perfil sinistramente caricatural de Kadhafi era já há muito tempo matéria para piadas dos artistas de palco.

A regra segundo a qual os processos secretos não devem ser compostos senão por notícias já conhecidas é essencial à dinâmica dos serviços secretos, e não apenas neste século. Se for a uma livraria consagrada a publicações esotéricas, verá que cada obra (sobre o Graal, o mistério de Rennes-le-Château, os Templários ou os Rosa-Cruz) repete exatamente o que já tinha sido escrito nas obras precedentes. E isso não apenas porque o autor de textos ocultos não gosta de fazer investigações inéditas (nem sabe onde procurar notícias sobre o inexistente), mas porque os que se dedicam ao ocultismo só acreditam naquilo que já sabem e que confirma o que já tinham aprendido.

É o mecanismo do sucesso de Dan Brown. E vale para os arquivos secretos. O informador é preguiçoso, e preguiçoso (ou de espírito limitado) é o chefe dos serviços secretos (caso contrário, podia ser, quem sabe, editor do Libération), que não reconhece como verdade a não ser aquilo que reconhece. As informações ultrassecretas sobre Berlusconi, que a embaixada norte-americana em Roma enviava ao Departamento de Estado, eram as mesmas que a Newsweek publicava na semana anterior.
Então porquê tanto barulho em torno das revelações destes processos? Por um lado, dizem o que qualquer pessoa informada já sabe, nomeadamente que as embaixadas, pelo menos desde o final da Segunda Guerra Mundial e desde que os chefes de Estado podem telefonar uns aos outros ou tomar um avião para se encontrarem para jantar, perderam a sua função diplomática e, à exceção de alguns pequenos exercícios de representação, transformaram-se em centros de espionagem. Qualquer espectador de filmes de investigação sabe isso perfeitamente e só por hipocrisia finge ignorar.

No entanto, o fato de ser exposto publicamente viola o dever de hipocrisia e serve para estragar a imagem da diplomacia norte-americana. Em segundo lugar, a ideia de que qualquer pirata informático possa captar os segredos mais secretos do país mais poderoso do mundo desfere um golpe não negligenciável no prestígio do Departamento de Estado. Assim, o escândalo põe tanto em cheque as vítimas como os “algozes”.

Mas vejamos a natureza profunda do que aconteceu. Outrora, no tempo de Orwell, podia-se conceber todo o poder como um Big Brother, que controlava cada gesto dos seus súbditos. A profecia orwelliana confirmou-se plenamente desde que, controlado cada movimento por telefone, cada transação efetuada, hotéis utilizados, autoestradas percorridas e assim por diante, o cidadão se foi tornando na vítima integral do olho do poder. Mas quando se demonstra, como acontece agora, que mesmo as catacumbas dos segredos do poder não escapam ao controle de um pirata informático, a relação de controle deixa de ser unidirecional e torna-se circular. O poder controla cada cidadão, mas cada cidadão, ou pelo menos um pirata informático – qual vingador do cidadão –, pode aceder a todos os segredos do poder.

Como se aguenta um poder que deixou de ter a possibilidade de conservar os seus próprios segredos? É verdade, já o dizia Georg Simmel, que um verdadeiro segredo é um segredo vazio (e um segredo vazio nunca poderá ser revelado); é igualmente verdade que saber tudo sobre o caráter de Berlusconi ou de Merkel é realmente um segredo vazio de segredo, porque releva do domínio público; mas revelar, como fez o WikiLeaks, que os segredos de Hillary Clinton são segredos vazios significa retirar-lhe qualquer poder. O WikiLeaks não fez dano nenhum a Sarkozy ou a Merkel, mas fez um dano enorme a Clinton e Obama.

Quais serão as consequências desta ferida infligida num poder muito poderoso? É evidente que, no futuro, os Estados não poderão ligar à Internet nenhuma informação confidencial – é o mesmo que publicá-la num cartaz colado na esquina da rua. Mas é também evidente que, com as tecnologias atuais, é vão esperar poder manter conversas confidenciais por telefone. Nada mais fácil do que descobrir se e quando um Chefe de Estado se desloca de avião ou contatou um dos seus colegas. Como poderão ser mantidas, no futuro, relações privadas e reservadas?

Sei perfeitamente que, no momento, a minha visão é um pouco de ficção científica e, por conseguinte, romanesca, mas vejo-me obrigado a imaginar agentes do governo a deslocar-se discretamente em diligências de itinerários incontroláveis, portadores de mensagens que têm de ser decoradas ou, no máximo, escondendo as raras informações escritas na sola de um sapato. As informações serão conservadas em cópia única, em gavetas fechadas à chave: afinal, a tentativa de espionagem do Watergate teve menos êxito do que o WikiLeaks.

Já tive ocasião de escrever que a tecnologia avança agora a passo de caranguejo, ou seja para trás. Um século depois de o telégrafo sem fios ter revolucionado as comunicações, a Internet restabeleceu um telégrafo com fios (telefônicos). As fitas de vídeo (analógicas) permitiram aos investigadores de cinema explorar um filme passo-a-passo, andando para trás e para diante, descobrindo todos os segredos da montagem; agora, os CD (digitais) permitem saltar de capítulo em capítulo, ou seja por macro porções. Com os trens de alta velocidade, vai-se de Roma a Milão em três horas, enquanto, de avião, com as deslocações que implica, é necessário três horas e meia. Não é, pois, descabido que a política e as técnicas de comunicação voltem ao tempo das carruagens.

Uma última observação. Antes, a imprensa tentava compreender o que se tramava no segredo das embaixadas. Atualmente, são as embaixadas que pedem informações confidenciais à imprensa.

Traduzido em PresseEurop, Portugal, disseminado pelo pessoal da Vila Vudu e adaptado para o português brasileiro pelo Viomundo

(agradeço ao amigo Flávio Nassar pelo acesso a este texto)

O que esperar do novo PNE?

Inicio com esta postagem uma série de reflexões sobre o novo PNE. Como já divulguei a expectativa é que o presidente Lula apresente o texto governamental na próxima quarta-feira (15).

Utilizo para esta primeira reflexão o interessante artigo do professor Luiz dourado, doutor em educação e professor titular da Universidade Federal de Goiás. Tive o prazer de trabalhar com ele durante breve período no INEP (2003).

Em recente artigo publicado no último a Revista Educação e Sociedade, o professor Luiz dourado faz uma avaliação do plano nacional de educação atual, problematizando questões estruturais e conjunturais e, a partir deste patamar, estimula uma reflexão sobre os possíveis limites do próximo plano.

Ele parte de uma análise de que “a educação é entendida como um direito social fundamental e que sua efetivação se dá em um contexto caracterizado como um campo de disputas de concepções e projetos” (p. 680). E relembra que as políticas educacionais em nosso pais têm sido marcadas pela lógica da descontinuidade/continuidade, pela falta de planejamento e por políticas de governo, em substituição de construções coletivas, ou seja, de políticas de Estado.

Ao resgatar a tramitação do atual PNE, afirma que sua aprovação foi fruto da hegemonia governamental no Congresso Nacional e que este guardou coerência com os pressupostos teóricos do governo FHC.

E resume o processo anterior:

“Como lógica e concepção política decorrentes desse processo, presenciamos a interpenetração entre as esferas publicas e privada sob a égide do mercado, o que, na prática, abriu espaços para a consolidação de novas formas de privatização da educação, sobretudo da educação superior” (p. 684).

Destas suas reflexões caberia fazer uma pergunta que julgo relevante:

O atual plano nacional de educação, aprovado em inícios de 2001, teve seu período de vigência majoritário no governo Lula que, em tese e programa, deveria ter representado uma ruptura com o governo FHC, inclusive na educação. Porém, pelo menos para parte dos pesquisadores da área, ocorreram mais continuidades do que ruptura durante o atual governo. Esta avaliação, caso correta, aponta para que limites e desafios de conteúdo no próximo Plano Nacional de Educação?

Uma das marcas da tramitação do plano anterior foi uma relação conflituosa entre sociedade civil organizada em torno do Fórum Nacional em Defesa da Escola Publica X governo federal e, em termos de relações intergovernamentais, pouco debate com os demais entes federados. O cenário de tramitação do próximo plano aponta para um processo diferente, pois tivemos uma Conferencia Nacional de Educação, onde diferentes atores sociais estiveram presentes e que elaborou uma serie de propostas para o novo texto.

A segunda pergunta é a seguinte:

O governo federal, que teve mais continuidades que rupturas em relação aos pressupostos teóricos do governo FHC, enviará ao Congresso Nacional uma proposta coerente com sua trajetória ou a mediará com a pressão da sociedade civil.

Daqui a dois dias saberemos.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Uma boa proposta

Na última quarta-feira (8.12), a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade o Projeto de Lei n°6266/2009, do Deputado Ivan Valente, que estabelece que a União, os Estados e Municípios sejam obrigados a compensar nos recursos da Educação qualquer perda decorrente de isenções fiscais.

A proposta garante que os recursos destinados à educação, em qualquer esfera de governo, não sejam reduzidos em função da concessão de isenções fiscais a empresas ou entidades privadas, como ocorreu no ano passado com as medidas tomadas pelo Governo Lula para combater a crise econômica.

O projeto do deputado Ivan Valente determina que, sempre que for concedida uma isenção fiscal, em qualquer esfera, o Poder Executivo deverá calcular a perda de recursos para a educação decorrente desta renúncia e providenciar o ressarcimento destes recursos até o fim do respectivo exercício financeiro.

“A aprovação do projeto na Comissão de Educação é extremamente importante. Trata-se de uma iniciativa fundamental para garantir que os recursos da educação, determinados constitucionalmente, não sejam desviados para o benefício do setor privado, trazendo enormes prejuízos para a educação pública de nosso país”, disse Ivan Valente. “É uma importante vitória da luta pelo direito à educação e pela escola pública de qualidade, pois impõe que a prioridade da educação se materialize em recursos, não se restringido aos discursos e propagandas oficiais”, acrescentou.

O projeto 6266/2009 ainda tramita na Comissão de Finanças e Tributação e na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara. Se aprovado, seguirá diretamente ao Senado.

O relator da matéria foi o deputado pernambucano Paulo Rubem Santiago, que não conseguiu se reeleger por que foi aceita uma candidatura “ficha suja” no seu estado e isso lhe tirou a vaga.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Lula anuncia PNE no dia 15


Depois de ser desmarcado por duas vezes, parece que agora vai.

Após conversa com o atual (futuro?) Ministro da Educação Fernando Haddad e com o Coordenador da Conae, Francisco das Chagas, o presidente Lula decidiu apresentar a proposta do governo para o novo Plano Nacional de Educação no próximo dia 15 de dezembro.

Valeu a pressão da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. O que se falava nos bastidores é que o anúncio seria no dia 27 de dezembro, entre uma confraternização natalina e os festejos de fim de ano.

Agora é esperar pela divulgação, analisar o texto governamental e preparar a mobilização para que este futuro plano corresponda aos anseios de uma educação pública, de qualidade e para todos.

Vai começar a correria de sempre


Dados disponíveis da execução orçamentária (8 de dezembro) mostram que o MEC conseguiu empenhar 85,1% dos recursos autorizados, sendo que pagou apenas 72,5%. Deduzindo o recurso efetivamente pago, significa dizer que o ministério possui 15,8 bilhões para gastar em 21 dias, contabilizando todos os feriados até o final do atual governo.

A situação não é pior por que parte dos gastos é com o custeio das universidades e institutos federais de educação, o que obriga desembolsos periódicos. Além desses gastos fixos, também contribui o desembolso da complementação do FUNDEB, do PDDE, da Alimentação e do Transporte Escolar, programas que funcionam de forma automática, independente de convênios ou regularidade fiscal dos demais entes federados.

Nas outra ponta, ou seja, no montante dos recursos denominados de transferências voluntárias, é que encontramos a permanência dos problemas de execução no Ministério. Para exemplificar apresento os números de duas importantes ações direcionadas para a educação básica.

A primeira é denominada de Apoio a Reestruturação da Rede Física Pública da Educação Básica, e é direcionada para apoiar estados e municípios a construir escolas. Dentro desta ação se localiza o importante programa do PDE denominado Proinfância, que financia construção de unidades de educação infantil. Pois bem, somados os recursos alocados pelo próprio MEC e as emendas parlamentares a ação tem 1,046 bilhão de reais autorizado, mas conseguiu empenhar até o momento apenas 65,9% deste valor e pagou apenas 9,3%, o que denota uma baixa execução física das construções.

Recordo que no PPA e no programa da presidente eleita se fala em acelerar a construção de unidades de educação infantil. Sem altera este padrão de execução, a proposta não vai sair do papel, criando uma falsa expectativa todos os anos.
A ação denominada Apoio ao Desenvolvimento da Educação Básica também é uma espécie de “guarda-chuva” de várias ações de apoio aos estados e municípios. Estão autorizados 1,367 bilhão de reais, mas até agora foram empenhados apenas 69,9% e efetivamente pagos 35,7%.

Nestes dias, infelizmente, vamos presenciar pela milésima vez, a correria para aumentar a execução orçamentária e financeira. Nesta reta final sempre os critérios técnicos são relativizados e a equidade na distribuição dos recursos é esquecida.

Valeria a pena o próximo governo dizer como pretende melhorar esta situação. A primazia de programas que não dependem de convênios pode ser um caminho, mas para que isso represente um real regime de colaboração, o formato destes programas deve ser pactuado em arenas decisórias com participação de todos os entes federados.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A educação não pode esperar

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação acaba de divulgar uma nota pública cobrando do governo federal o imediato envio da proposta de Plano Nacional de Educação. Vejam abaixo o teor do posicionamento.

A educação não pode esperar

Atraso do Executivo Federal na divulgação de sua proposta de PNE 2011-2020


O Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, correspondendo à deliberação expressa em 29 de novembro de 2010 pelos comitês nordestinos da rede, em encontro regional ocorrido em Fortaleza/CE, solicita que o Ministério da Educação e a Presidência da República tornem público e enviem ao Congresso Nacional o texto do Plano Nacional de Educação 2011-2020 antes que seja iniciado o recesso parlamentar.

Como outros movimentos educacionais, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação foi surpreendida com o adiamento da solenidade de lançamento do PNE 2011-2020, que estava marcada para o dia 29 de novembro de 2010. Adiamentos anteriores, decorrentes do calendário eleitoral, foram devidamente justificados e compreendidos. No entanto, dessa última vez, sequer houve justificativa formal que explicasse a prorrogação da atividade.

O Plano Nacional de Educação, segundo o Art. 214. da Constituição Federal de 1988, conforme as alterações promovidas pela Emenda à Constituição 59/2009, deve ser um instrumento capaz de articular o Sistema Nacional de Educação – por meio do regime de colaboração e ações integradas entre os poderes públicos das diferentes esferas federativas –, definindo diretrizes, objetivos, metas e estratégias capazes de assegurar a manutenção e o desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades. Primordialmente, seu intuito deve ser a superação do analfabetismo, a universalização do atendimento escolar, a melhoria da qualidade do ensino, a formação dos cidadãos para o mundo do trabalho e a promoção humanística, científica e tecnológica do Brasil. Para tanto, a Constituição Federal determina que o PNE estabeleça uma meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto (PIB).

Portanto, sendo o fio condutor da política de Estado na área da educação, graças às suas próprias atribuições constitucionais, o PNE deve ser superior às vontades governamentais, partidárias e de grupos de interesse. No entanto, o atual PNE, em vigência até dezembro de 2010, careceu – fundamentalmente – de respeito e atenção por parte dos governantes. Estima-se que apenas um terço de suas metas foram cumpridas e poucas versões de planos estaduais e municipais foram criadas. Além disso, infelizmente, muitos educadores desconhecessem por completo o texto do PNE atual.

Devido ao baixo grau de pertencimento público do plano atualmente em vigor, tanto por parte dos governos que o desconsideraram, como por parte de alguns setores da sociedade civil, que o ignoraram, a Comissão Organizadora da Conferência Nacional de Educação colocou o PNE no centro da roda dos debates da Conae. Contando com a participação de mais de 3 milhões de cidadãos, a Conferência produziu e depurou diretrizes que oferecem bons subsídios para a elaboração do texto do novo Plano. Ressalta-se que uma versão preliminar foi debatida entre o Ministro da Educação, Fernando Haddad, e o colegiado da Comissão Organizadora Nacional da Conae, da qual a Campanha Nacional pelo Direito à Educação é membro titular. Ou seja, em termos de interlocução política entre a sociedade civil e o Estado, há força suficiente para lançá-lo.

Obviamente, o texto apresentado pelo MEC não reflete por completo as opiniões da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e nem corresponde a todas as deliberações da Conae. É fruto de uma negociação, sendo, inclusive, objeto de análise no interior do próprio Governo Federal. Contudo, é fundamental que a proposta do Executivo seja logo tornada pública. O atraso cada vez maior na tramitação do novo PNE no Congresso Nacional aumenta gravemente o hiato legal que já existirá entre o PNE atual, cuja vigência expira em dezembro de 2010, e o próximo. A educação brasileira, que enfrenta tantos desafios, não pode prescindir de um fio condutor nacional. E a sociedade civil não pode mais esperar para iniciar sua incidência sobre o novo PNE.

Estamos certos de que estamos preparados para incidir sobre o texto do novo PNE no Congresso Nacional, tal como fizemos com o Fundeb – quando fomos bem-sucedidos, entre tantas outras, nas lutas pela inclusão das creches e na obrigação da participação financeira da União no novo fundo. No entanto, para agirmos, é necessário que o texto seja oficialmente lançado e enviado ao Congresso Nacional. E a educação brasileira não pode esperar mais.

Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação:

Ação Educativa
ActionAid Brasil
Cedeca CE (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará)
Centro de Cultura Luiz Freire
CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação)
Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente
Mieib (Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil)
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
Uncme (União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação)
Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação)


Comitês Nordestinos da Campanha Nacional pelo Direito à Educação:

Comitê Alagoano
Comitê Baiano
Comitê Cearense
Comitê São Luís - Maranhão
Comitê Regional dos Cocais (Maranhão)
Comitê Paraibano
Comitê Pernambucano
Comitê Piauiense
Comitê Potiguar
Comitê Sergipano

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

É pouco!

Em entrevista concedida no dia de hoje ao Portal G1 o atual ministro da educação declarou:

“Difícil imaginar um cenário sem valorização do professor. A partir de 2012, o jogo muda. Aí vamos estar liderando a América Latina e vamos estar em outra divisão do campeonato. O que é prioritário para que nós continuemos é [investir em] educação infantil e [na] valorização do professor”, disse Haddad.

E afirmou também que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve anunciar nos próximos dias o novo plano de educação, que vai fixar a meta de investir 7% do PIB em educação nos próximos dez anos.

Em 2001 o gasto público com educação era 3,9% do PIB, depois de uma década chegamos em 2009 com 5%. E esse lento crescimento não foi suficiente para dar um salto de qualidade nem cumprir as metas de inclusão escolar do PNE em vigor.

A recente Conferência Nacional de Educação aprovou uma meta mais audaciosa do que a que o ministro está afirmando que será incluída pelo governo no projeto de lei do próximo PNE. Na verdade, caso se confirme a afirmação do atual ministro, o governo estará colocando no novo plano o que foi acordado no congresso para ser aplicado na década passada.

É pouco para dar conta de:

a. Incluir 1,4 milhão de crianças de quatro e cinco anos até 2016;

b. Incluir 1,5 milhão de jovens entre 15 e 17 anos até 2016;

c. Garantir uma melhor proporção entre ensino público e privado na educação superior e aumentar o cobertura escolar na faixa entre 18 e 24 anos.

d. Incluir de forma mais significativa crianças de zero a três anos em atendimento de creche pública.

e. Sair do 53º lugar na prova da OCDE (PISA) ou então melhorar a qualidade do aprendizado de nossos alunos;

f. Alcançar um padrão mínimo de qualidade, especialmente nos estados mais pobres, promovendo uma maior equidade na distribuição dos insumos educacionais entre estados, municípios e regiões.

g. Pagar um salário digno para os professores, tornando a profissão atrativa.

Todos estão com a razão

Hoje foi divulgado o resultado do PISA 2009. O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), avalia os conhecimentos de leitura, ciências, matemática em 65 países.

Apesar de existir apenas um relatório, as manchetes da grande imprensa e do INEP são antagônicas. No Portal G1 estampou: Brasil melhora média, mas fica entre piores em ranking de ensino da OCDE. Já o Estadão, por incrível que pareça, colocou uma manchete mais próxima do que o INEP destacou: Brasil tem 3ª maior evolução no Pisa, mas matemática ainda é desafio.

No portal do INEP a manchete foi a seguinte: Brasil está entre os países que mais crescem no Pisa e cumpre meta do PDE.

Analisando a síntese de Relatório, posso dizer que o resultado permite e justifica diferentes abordagens, de acordo com as preferências dos donos dos veículos (mais situacionistas ou oposicionistas).

1. É verdade que o Brasil teve a terceira melhor taxa de crescimento em relação aos números de 2000, ficando apenas atrás do Chile e Luxemburgo. Porém, isso deve ser relativizado, pois países que já possuem altas notas tendem a crescer de forma mais lenta e, de outro lado, países com potencial econômico maior e que estavam com notas baixas, tendem a crescer mais rápido. De qualquer forma é uma boa notícia.

2. É verdade também que continua um descompasso entre o desenvolvimento econômico de nosso país e suas notas no PISA. Estamos em 53º lugar de 65 países testados. Ganhamos da Albânia, do Kazaquistão, do Azerbaijão e da Colômbia. Mas perdemos de Trinidad e Tobago, Turquia e Letônia, para citar somente alguns.

3. Dos países denominados BRICS, somos o pior colocado. A China aparece em 1º e a Rússia em 40º. A índia não participa da prova.

Mais do que comparar nosso desempenho com os demais países, os dados confirmam que as desigualdades entre as redes continuam graves no Brasil, fruto inclusive de investimentos diferenciados em termos financeiros. Assim, a nota do Brasil no PISA é 401, o que nos colocou na 53º posição, mas se fosse considerado apenas a rede pública federal a nossa posição seria 7º, na frente do Canadá e Nova Zelândia. Se fosse considerada apenas a nota de rede particular nossa posição seria 18º, na frente da Noruega e Reino Unido.

Acontece que a maioria dos nossos alunos estuda na rede pública estadual e municipal e estas duas redes alcançaram apenas 387 pontos. E é justamente aonde precisamos mais investir em qualidade.

Alguma coisa pra comemorar, mas com moderação.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Piso salarial e PNE

A repórter Lisandra Paraguassú, da equipe do Estadão em Brasília publicou hoje uma matéria que relata a intenção do governo federal de incluir meta de aumento real do valor do piso salarial nacional do magistério. A intenção é chegar a 3 mil reais em 10 anos.

A matéria diz textualmente:

“O Plano Nacional de Educação para 2011-2021, que o governo está terminando de desenhar, trará ao menos uma proposta que promete incomodar Estados e municípios e criar uma briga no Congresso: o reajuste real, previsto em lei, para o piso dos professores. Hoje em R$ 1.024,67, o piso, aprovado em 2008, ainda é considerado baixo pela União, mas quem paga a conta, prefeituras e governos estaduais, julga o valor atual alto”.

Infelizmente a jornalista na apresenta nenhuma fonte do MEC e buscou apenas o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski (aliás, não é prefeito, mas preside uma entidade de prefeitos!). Esse senhor disse que "o problema não é aumentar. Os professores precisam ganhar bem. A questão é quem vai pagar a conta. As prefeituras estão no limite. Poderia ter aproveitado e conversado com mais setores da sociedade civil e com outras representações dos prefeitos, secretários de educação e dos trabalhadores.

A colocação do representante da CNM é relevante, mas gostaria de reformulá-la: quanto de recurso a União pretende dispor para auxiliar estados e municípios a não somente pagar o piso, mas também conceder aumentos reais no decorrer dos próximos anos?

O debate do piso deve estar atrelado a como o Estado Brasileiro vai se organizar para elevar os gastos educacionais para patamares que permitam incluir milhões de alunos que se encontram fora da escola e, ao mesmo tempo, pagar salários dignos para os professores.

O mais incrível disso tudo é que a Lei do Piso estabelece que 10% do montante de recursos da complementação da União no Fundeb devem ser aplicados no auxilio aos estados e municípios que comprovarem a impossibilidade de pagar o piso. Até o momento nenhum ente federado recebeu nenhum tostão para esta nobre causa.

É verdade que a portaria que definiu as regras era impraticável em termos operacionais, mas falta um esforço mais decidido para estabelecer regras transparentes para que sejam liberados os recursos. Em 2011 estarão disponíveis 900 milhões de reais.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Notícias sobre o Fundeb 2011


Levando em consideração as informações enviadas pelo Governo Federal nos anexos do Orçamento de 2011, podemos enumerar as principais características do Fundeb para o ano que vem:

1. O total de recursos a serem depositados pelos estados e municípios em cada fundo estadual será de 90,8 bilhões de reais.

2. Assim, a complementação da União devida para 2011 obrigatoriamente deve ser 9 bilhões. Porém, dentro do próprio ano serão repassados 85% deste valor (7,7 bilhões).
3. Como este procedimento já foi feito em 2010, temos 1,19 bilhão devido aos fundos estaduais. Somado os dois valores a complementação da União em 2011 está projetada para 8,917 bilhões.

4. Com estes números e já estando disponível o dado censitário de 2010, o valor mínimo por aluno das séries iniciais projetado será de R$ 1438,82, representando variação bastante pequena em relação ao valor projetado para 2010 (R$ 1415,97).
5. Dez estados serão beneficiados pela complementação. Serão os nove dos últimos anos mais o Rio Grande do Norte. O gráfico acima demonstra o valor projetado de complementação para cada um deles.

São números provisórios, que certamente serão atualizados no inicio do próximo ano.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Adiado

Acabo de tomar conhecimento que a apresentação do projeto do MEC para novo Plano Nacional de Educação.

O anúncio seria feito na mesma cerimônia que ocorre no Palácio do Planalto, onde o presidente Lula entrega simbolicamente institutos federais e campis universitários.
Não consegui ainda uma explicação para o fato.

Era bom que estas explicações fossem dadas pelo MEC.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Inscrições na Plataforma Freire foram prorrogadas

Foram prorrogadas até 15 de dezembro as pré-inscrições na Plataforma Freire para formação inicial de professores que atuam na educação básica pública de todo o país — o prazo original seria encerrado na terça-feira, 30. Para o primeiro semestre de 2011, são oferecidas 40 mil vagas em cursos de licenciatura presenciais e sete mil em cursos a distância em instituições públicas (federais e estaduais) e comunitárias sem fins lucrativos.

Será permitida apenas uma pré-inscrição em curso de formação inicial. O professor deve estar cadastrado no Educacenso de 2009 e na Plataforma Freire. De 16 a 22 de janeiro, as secretarias estaduais e municipais de educação validarão as pré-inscrições. Em seguida, como prevê o novo calendário, enviarão as listas dos professores selecionados às instituições de educação superior de cada estado.

Finalmente a proposta de PNE

Na segunda-feira (29 de novembro), em cerimônia no Palácio do Planalto, o governo federal apresentará a sua proposta de Plano Nacional de Educação para a próxima década (2011 a 2020).

Será às 10 horas e para um público selecionado. Como estão no final do governo, também se aproveitará a ocasião para inaugurar 25 campi das Universidades Federais e 30 campi dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.

Espero que a proposta guarde coerência com o esforço elaborativo da Conferência Nacional de Educação e não com a política econômica conservadora, que prioriza superávit primário e aumenta o déficit social.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Fiscalização

O portal do STF divulgou no dia de ontem que por maioria de votos, os ministros decidiram que a investigação da CGU deve se limitar às verbas federais repassadas pela União aos municípios por meio de convênios, não alcançando os recursos de outras origens. Com isso, os prefeitos não podem ser obrigados a exibir documentos e comprovar gastos que estejam fora deste limite.

A decisão foi tomada no julgamento de Recurso em Mandado de Segurança (RMS 25943), impetrado pela defesa de Antônio Carlos Vasconcelos Calmon, ex-prefeito do município de São Francisco do Conde (BA). O recurso – remetido ao Plenário pela Primeira Turma do STF, diante de sua relevância – foi rejeitado porque, no mérito, pedia que o STF declarasse a insubsistência do sorteio e reconhecesse a impossibilidade de o órgão do governo federal fazer investigações desse tipo.

Concordo com a decisão do STF sobre os limites da CGU, mas o principal problema não é esse. A fragilidade da fiscalização está:

1. Na baixa capacidade técnica da maioria dos tribunais de Contas nos Estados e dos Tribunais de Contas dos Municípios (onde existem).

2. Na ingerência política dentro dos Tribunais de Contas Estaduais e Municipais, que tornam suas decisões no mínimo incoerentes e questionáveis.

3. Na pouca vontade política das Câmaras Municipais em cumprir sua obrigação constitucional de fiscalizar o Executivo.

4. Na fragilidade dos conselhos de controle social, muitos controlados pelo Executivo.

As ações fiscalizadoras da CGU, mesmo que legalmente limitadas à investigação de recursos federais repassados aos municípios, depara-se com a seguinte situação: quem rouba dinheiro público não rouba apenas de uma fonte, atua em todas as áreas.

Ou seja, ao ser detectada irregularidade grave em convênios federais, caberia aos órgãos de controle externo estadual e municipal investigar o restante das contas.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Plataforma Freire recebe até dia 30 inscrições para cursos

Está aberto até o próximo dia 30 o período de pré-inscrições na Plataforma Freire, para formação inicial de professores que atuam na educação básica pública de todo o país. Para o primeiro semestre de 2011, serão oferecidas 40 mil vagas em cursos de licenciatura presenciais e 7 mil em cursos a distância, em instituições públicas (federais e estaduais) e comunitárias sem fins lucrativos.

Será permitida apenas uma pré-inscrição em curso de formação inicial e o professor deverá estar cadastrado no Educacenso 2009 e na Plataforma Freire. De 1º de dezembro de 2010 até 7 de janeiro de 2011, as secretarias estaduais e municipais de educação validarão as pré-inscrições. Em seguida, enviarão as listas dos professores escolhidos às instituições de educação superior de cada estado.

A Plataforma Freire faz parte do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor), gerido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), em parceria com as secretarias de educação dos estados e dos municípios e as instituições públicas de ensino superior. O objetivo é melhorar a formação dos docentes em exercício na rede pública, o que influencia na qualidade do ensino que as crianças e os jovens recebem nas escolas.

Participam do Parfor 141 instituições de educação superior, de 25 estados, que oferecem cursos de licenciatura presenciais e a distância – estes, pela Universidade Aberta do Brasil (UAB).

(Da Assessoria de Comunicação Social do MEC)

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Revolta da Chibata


Revolta da Chibata foi um movimento de marinheiros da Marinha do Brasil que se desenrolou de 22 a 27 de novembro de 1910 no Rio de Janeiro que era na época o Distrito Federal. Na ocasião, dois mil marinheiros rebelaram-se contra a aplicação de castigos físicos a eles impostos como punição, ameaçando bombardear a cidade do Rio.

Os castigos físicos, abolidos na Marinha do Brasil um dia após a Proclamação da República, foram restabelecidos no ano seguinte (1890), estando previstas:

"Para as faltas leves, prisão a ferro na solitária, por um a cinco dias, a pão e água; faltas leves repetidas, idem, por seis dias, no mínimo; faltas graves, vinte e cinco chibatadas, no mínimo."

O estopim da revolta acabou sendo a punição aplicada ao marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes do Encouraçado Minas Gerais, em trânsito para o Rio de Janeiro. Por ter ferido um cabo com uma navalha, foi punido, não com as vinte e cinco chibatadas mínimas regulamentares, e sim com duzentos e cinqüenta, na presença da tropa formada, ao som de tambores. O rigor dessa punição, considerada desumana, provocou a indignação da tripulação.

Os marinheiros, tendo João Cândido como líder, resolveram sublevar-se imediatamente. Num golpe rápido, apoderaram-se dos principais navios da Marinha de Guerra brasileira e se aproximaram do Rio de Janeiro. Em seguida mandaram mensagem ao presidente da República e ao ministro da Marinha exigindo a extinção do uso da chibata.

Depois de muitas reuniões políticas, nas quais entrou, entre outros, Rui Barbosa, que condenou os “abusos com os quais, na gloriosa época do abolicionismo, levantamos a indignação dos nossos compatriotas”, foi aprovado um projeto de anistia para os amotinados. Com isto, os marinheiros desceram as bandeiras vermelhas dos mastros dos seus navios. A revolta havia durado cinco dias e terminava vitoriosa. Desaparecia, assim, o uso da chibata como norma de punição disciplinar na Marinha de Guerra do Brasil.

Contudo, logo em seguida, os militares resolvem exterminar os revoltosos. São acusados de conspiradores, espalham boatos de que haveria uma outra sublevação. Finalmente, afirmam que a guarnição da ilha das Cobras havia se sublevado. Pretexto para que a repressão se desencadeasse violentamente sobre os marinheiros negros. O presidente Hermes da Fonseca necessitava de um pretexto para decretar o estado de sítio, a fim de sufocar os movimentos democráticos que se organizavam. As oligarquias regionais tinham interesse em um governo forte. Os poucos sublevados daquela ilha propõem rendição incondicional, o que não é aceito. Segue-se uma verdadeira chacina. A ilha é bombardeada até ser arrasada. Estava restaurada a honra da Marinha.

João Cândido e os seus companheiros de revolta são presos incomunicáveis, e o governo e a Marinha resolvem exterminar fisicamente os marinheiros. Embarca-os no navio Satélite rumo ao Amazonas.

Os 66 marujos que se encontravam em uma masmorra do Quartel do Exército e mais 31, que se encontravam no Quartel do 1º Regimento de Infantaria, são embarcados junto com assassinos, ladrões e marginais para serem descarregados nas selvas amazônicas. Os marinheiros, porém, tinham destino diferente dos demais embarcados. Ao lado dos muitos nomes da lista entregue ao comandante do navio, havia uma cruz vermelha, feita a tinta, o que significava a sua sentença de morte. Esses marinheiros foram sendo parceladamente assassinados: fuzilados sumariamente e jogados ao mar.

João Cândido, que não embarca no Satélite, juntamente com alguns companheiros foram recolhidos a uma masmorra da ilha das Cobras, onde viviam como animais. Dos 18 recolhidos ali, 16 morreram. Uns fuzilados sem julgamento, outros em conseqüência das péssimas condições em que viviam enclausurados.
Perseguido constantemente, João Cândido morre como vendedor no Entreposto de Peixes da cidade do Rio de Janeiro, sem patente, sem aposentadoria e até sem nome, este herói que um dia foi chamado, com mérito, de Almirante Negro.

Somente em 2008 foi aprovada a Lei nº 11.756, que concedeu anistia post mortem a João Cândido Felisberto, líder da chamada Revolta da Chibata, e aos demais participantes do movimento.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Autonomia x Soberania

O Estadão de hoje publica matéria afirmando que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, está decidido a não aceitar nenhum convite para permanecer à frente da instituição, caso a presidente eleita, Dilma Rousseff, não lhe garanta autonomia absoluta de ação.

Ele considera que ceder na autonomia – e há informações de que ela lhe será tomada, de forma a fazer com que a taxa de juros venha a sofrer queda mais rápida, até chegar a 2% (acima da inflação) em 2014 – comprometerá sua biografia e a credibilidade que conquistou nos oito anos à frente do BC, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

No ano passado o pagamento e a rolagem da dívida pública consumiu em 2009 380 bilhões de reais, mesmo desconsiderando-se o chamado “refinanciamento”, ou “rolagem”, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos.

Para se ter uma idéia do tamanho desta sangria, basta comparar com o debate que está ocorrendo sobre o salário mínimo. Segundo o deputado Ivan Valente (PSOL/SP), cujo partido propôs um salário mínimo de 700,00 reais para 2011, “o governo alega que cada R$ 1 de aumento no salário mínimo gera uma despesa anual de R$ 286,4 milhões, com pagamento de aposentadorias e outros benefícios vinculados ao salário mínimo. Portanto, para se obter, por exemplo, o salário mínimo de R$ 700, seriam necessários R$ 46 bilhões, quantia esta equivalente a apenas 44 dias de pagamento da dívida”.

A denominada “autonomia” do Banco Central é um dos instrumentos mais nocivos da política econômica conservadora que, infelizmente, durante oito anos foi mantida pelo Presidente Lula. Ela serve para deixar o BC à mercê dos interesses dos credores de nossa dívida pública, que precisam de juros altos para manter a remuneração que recebem. Alguns até denominaram este procedimento de “bolsa-banqueiro”.

Não tenho muita esperança de que a presidenta eleita vá ter uma política qualitativamente diferente do seu antecessor, mas não manter Henrique Meireles no BC é bom, mas espero que não seja apenas uma troca de seis por meia dúzia.

O Brasil precisa recuperar sua soberania e colocar seus recursos a serviço de um projeto de nação, que garanta desenvolvimento com inclusão social.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Um pouco de lucidez


Fiquei muito feliz ao tomar conhecimento do pronunciamento feito pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL/SP) sobre o ENEM. Infelizmente são poucas as vozes neste nosso parlamento que oferecem um conteúdo que saia do lugar comum do que é pautado pela grande imprensa ou pelo portal do MEC.
Merece uma leitura atenta. Reproduzo na íntegra.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,

Ocupo a tribuna para contribuir com o debate recente que esta Casa faz acerca dos últimos acontecimentos em torno do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem. Prefiro, no entanto, seguir num rumo oposto do que tem apresentado tanto o governo, que parece não enxergar as deficiências técnicas e políticas do exame, quanto a oposição, que, sem pauta política definida, tenta transformar as falhas ocorridas no exame, que são graves, sem duvida, e levam ansiedade e grandes prejuízos aos estudantes, mas não tocam nos problemas estruturais desse exame.

A década de 90 foi considerada por diversos especialistas da área educacional como a década da avaliação. Mais especificamente o período que compreendeu o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do Ministro da Educação Paulo Renato, quando a avaliação da educação brasileira ganhou centralidade nas políticas públicas educacionais no País e culminou num Sistema Nacional de Avaliação em detrimento de um Sistema Nacional de Educação. Destacaram-se inciativas como o ENEM e o Exame Nacional de Cursos, conhecido como Provão.

Naquela época, ocupamos por diversas vezes esta tribuna para denunciar o caráter meritocrático, classificatório e de ranqueamento das instituições desses exames, por compreender que os mesmos não contribuíam com a melhora efetiva dos padrões de qualidade social da educação brasileira. Da forma como eram formulados, implementados e aplicados, os exames transferiam aos estudantes a responsabilidade pelo bom desempenho do ensino médio e superior, abstraindo os fatores sociais e econômicos que condicionam tal ou qual trajetória escolar e social. Os exames tampouco avaliavam os limites apresentados por escolas que contam com precárias condições de funcionamento, oferecidas pelo setor público e que tradicionalmente atendem à população mais carente.

O ENEM segue a mesma lógica. Segundo professora Sandra Zákia, da Universidade de São Paulo, o ENEM apenas se constitui em “uma medida de resultado final, interpretada em uma perspectiva individualizada, desconsiderando as condições dos sistema de ensino que, sem duvida, induzem a produção de “competência” ou “incompetência” nos alunos”.


Esses fatores fazem do ENEM um simples exame de classificação que teve - e tem - como objetivo condicionar os currículos das escolas a uma certa padronização que não combina com um País de dimensões continentais e com diferenças sociais tão gritantes.


Para nós, Senhores Deputados e Deputadas, o ENEM, assim como os exames de larga escala implementados na década de 90, tornou-se instrumento que induz a um tipo de gestão da educação que aposta na competição entre os estudantes e escolas. Que miniminiza o papel do Estado na promoção de uma educação de qualidade e maximiza o caráter individualista e competitivo na educação, importando uma lógica de mercado e incentivando a adoção de modelos de gestão privada, cuja enfase é posta nos resultados ou produtos do sistema educacional.

Acompanhando este paradigma, o atual governo não só manteve o ENEM como incentivou a ampliação de sua utilização. Hoje o Exame é responsável por pouco mais de cem mil bolsas do PROUNI e aproximadamente 83 mil vagas em universidades federais. Diferente da década passada, hoje o “novo” ENEM assume uma importância comercial de grande relevância. A partir do momento em que passa a ser instrumento indispensável para o acesso a bolsas do PROUNI e, posteriormente, passa a ser portal de ingresso às universidades federais, o Exame aprofunda uma dimensão classificatória e competitiva e assume sua vocação de ser um grande vestibular nacional, atestando sua incompetência em avaliar e contribuir para as melhoras do ensino médio no País.

Além disso, o “novo” ENEM foi pintado pelo Ministério da Educação como forma de democratizar o acesso ao ensino superior e substituir o desigual vestibular. Porém, o ENEM mantém o uso dos resultados de provas para classificar e selecionar alunos, como já acontece nos vestibulares. Longe de defendermos o sistema atual mas, diferente do ENEM - uma prova padronizada -, os vestibulares ainda dão espaço para que as especifidades de cada região e universidade possam ser levadas em consideração num processo classificatório.

É preciso desmistificar metas pretensiosas como a de democratizar o acesso às vagas e possibilitar a mobilidade acadêmica. Pois fica claro que não há evidencias, como disse a Profª Maria Angelica Minhoto da UNIFESP, que permitam considerar eficientes as mudanças no ENEM para alterar o perfil dos ingressantes em cursos de grande atratividade. Entre as variáveis que impactam a definição dos ingressantes, destaca-se o nível sócio-econômico.

Os estudos sobre perfil dos ingressantes nas universidades apontam que o nível socioeconômico dos estudantes influencia bastante no processo classificatório. Entende-se que aqueles estudantes que tem acesso a uma escola de melhor qualidade obtem níveis mais avançados do que aqueles que tiveram acesso a escolas de menor qualidade. O “novo” ENEM não leva isso em consideração e, ao mesmo tempo em que possibilita uma disputa nacional para o acesso as universidades, não viabiliza maior chance de ingresso aos estudantes de classes mais populares. Dessa forma, a possibilidade de escolha nacional dá mais chance aos que já tem. Assim, essa nova forma de ingresso às universidades dá mais chances a um tipo de seletividade social travestida de seletividade técnica, fortalecendo o ingresso nas universidades públicas federais de alunos de maior poder aquisitivo e de regiões mais ricas do país.

Registre-se que o sistema brasileiro de educação superior é um dos mais excludentes do mundo. Apenas 13% dos jovens entre 18 e 24 anos nele estão matriculados, menos de um quarto estuda em instituições que articulam ensino, pesquisa e extensão com qualidade; a maior parte delas são as universidades públicas.

Fundamental, também, é o debate sobre o ensino médio que a questão do ENEM evidencia. Se tem méritos ao buscar um caminho nacional, mais igualitário para acesso às oportunidades educacionais na educação superior, é necessário valorizar o ensino médio não como curso de “passagem”, mas como parte fundamental da educação básica e de formação do cidadão.

Portanto, senhoras e senhores Deputados, cabe a esta Casa contribuir para um amplo debate acerca das condições da educação pública brasileira. O Plano Nacional de Educação, que apresentamos na Câmara, apontava para um tipo de avaliação formativa nas diversas etapas do ensino, que se direciona para um processo que envolve todos os que constroem o cotidiano da educação: gestores, corpo docente e discente, os técnicos-administrativos e a comunidade escolar. Um processo que tenha como estratégia a melhoria da educação pública em todas as suas dimensões e que não seja simplesmente um processo de classificação e dualização entre estudantes bons e ruins.

Aperfeiçoar um exame que continua sendo classificatório parece-nos não adiantar. Efetivo seria aplicar as verbas compatíveis com as propostas do Plano Nacional de Educação de 1998, para universalizar com qualidade o ensino médio e ampliar significativamente o acesso a educação superior pública e de qualidade.

Teremos, a partir do próximo ano, a possibilidade de enfrentar este debate na formulação do novo Plano Nacional de Educação. Caberá a esta Casa, em conjunto com os diversos segmentos da educação brasileira, formular um novo tipo de avaliação que esteja condicionado a um Sistema Nacional de Educação amplo e articulado, em detrimento de um Sistema Nacional de Avaliação, desigual e excludente.

Por fim, queremos afirmar que cabe ao MEC consertar os erros e manter a isonomia de condições do certame. Mas ao entrar neste debate fica claro que não existe ENEM para fazer avaliação do ensino médio, da mesma forma que vestibular de universidade não avalia o ensino médio dos seus participantes nem os próprios participantes. Os estudantes não podem ficar no meio de um fogo cruzado, onde são os principais prejudicados.

Muito obrigado.

Dep. Federal Ivan Valente
Líder do PSOL
(a foto do deputado é do Jornal O Estado de São Paulo)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Quem poderá nos defender?

Esta frase se popularizou no seriado Chaves, sendo a deixa para a aparição do personagem denominado Chapolin Colorado.

Relembro a frase para resumir o sentimento de muitos professores durante o debate ocorrido no Congresso dos Professores de Sergipe acerca dos episódios de desvios e fraudes de recursos educacionais.

Percebi um sentimento de impotência. Os representantes dos professores relataram que:

1. Ao identificarem suspeitas de irregularidades são impedidos de verificar as contas do Fundeb;

2. Que em várias cidades existe uma postura omissa dos representantes do Ministério Público, que deveriam estar lá para fazer valer o cumprimento das leis em nosso país;

3. Que há confusão sobre a quem devem recorrer.

Infelizmente é a pura verdade. Isso acontece por uma conjugação de fatores:

1. Fragilidade da organização da sociedade civil e controle político coronelista em vários municípios brasileiros;

2. Autoritarismo de inúmeras gestões educacionais, que se negam a cumprir os dispositivos da Lei n° 11.494 de 2007;

3. Dificuldade legal sobre a quem recorrer. Na verdade, não é que não existe clareza sobre isso. O controle externo das contas públicas é feito pelo Tribunal de Contas e a Câmara Municipal de Vereadores. O ministério Público, como fiscal da lei, também trem decisivo papel neste organograma. O problema que estas instâncias ficam, na maioria das vezes, em postura omissa ou conivente com os acontecimentos.

É necessário criar um sistema nacional de educação que estabeleça outras instâncias a quem apelar. De preferência mais eficientes do que as atuais.

sábado, 13 de novembro de 2010

Questões relevantes

No último dia 11 de novembro eu estive em Aracaju. Naquela aprazível cidade participei de debate sobre os desafios sindicais após a realização da Conferência Nacional de Educação – CONAE.

Fiquei positivamente satisfeito com o nível das perguntas feitas pelos professores presentes. Várias questões relevantes foram abordadas. Escolhi algumas para comentar neste espaço virtual.

Papel dos Conselhos Municipais de Educação

Ao debatermos a proposta da CONAE de fortalecimento destas instâncias de controle social foi relatado um desvirtuamento do papel dos conselhos. Em algumas cidades sergipanas os conselhos estão assumindo tarefas de avaliação de desempenho dos professores, procedimento que constitui requisito para progressão na carreira profissional.

Concordo que esta não é uma tarefa de conselhos de controle social, mesmo que esses possam e devam verificar e discutir o desempenho da rede escolar, monitorando o quanto de qualidade é alcançado. Porém, neste caso especifico, a avaliação de desempenho dos docentes pode e deve ser feita com participação da categoria, por meio de comissões de servidores efetivos, pro exemplo.

Limites de fiscalização dos conselhos

Também foram feitos questionamentos sobre a limitação existente nas competências fiscalizadoras dos conselhos de acompanhamento do Fundeb, limite este expresso no próprio nome do conselho, ou seja, ele possui um raio de alcance somente circunscrito nos recursos do fundo, ficando sem fiscalização os 5% de transferências constitucionais federais e estaduais e os 25% dos recursos arrecadados pelo próprio município. Sem falar em outros convênios e nos recursos da cota do salário-educação.
Essa é uma batalha que precisa ser priorizada.

Ao mesmo tempo em que devemos fundir toda a fiscalização e planejamento educacional em uma única instância de controle, no caso o Conselho Municipal de Educação, devemos também garantir uma ampliação da competência fiscalizadora.

Jogo de empurra-empurra

Foi denunciada a dificuldade de relacionamento entre a esfera estadual e municipal. O exemplo oferecido foi do transporte escolar. Realmente o transporte escolar é um emblemático da dificuldade de se estabelecer um verdadeiro regime de colaboração entre os entes federados.

Vejamos como funciona atualmente a oferta de transporte escolar:

1. A maioria das crianças é transportada pela esfera municipal;

2. A esfera federal participa financeiramente por meio do PNATE, mas estes recursos correspondem, em média, a 15% do efetivamente necessário;

3. Parte dos recursos do PNATE que pertenceria à esfera estadual é repassada a esfera municipal, pois esta efetivamente transporta os alunos da rede estadual de ensino. Como o recurso repassado pelo PNATE é insuficiente, este procedimento só aumenta o déficit municipal;

4. Em vários estados existem repasses estaduais para complementar o valor gasto pelos municípios, mas esse procedimento não acontece em todos os estados e seus formatos são bastante variados.

Este é um exemplo do prejuízo para a qualidade da oferta de serviço educacional provocado pela falta de cooperação entre as esferas do Estado Brasileiro.

Fico feliz de ter auxiliado em alguma medida a elucidação destes e de outros importantes questionamentos dos professores sergipanos.