sexta-feira, 28 de março de 2014

A incoerência perigosa


Na próxima quarta-feira (2 de abril) está prometida a realização do último capítulo da longa novela que se transformou a tramitação do Plano Nacional de Educação. A Comissão Especial da Câmara dos Deputados votará o Relatório do deputado Ângelo Vanhoni e decidirá que modificações feitas pelo Senado serão incorporadas ao texto final.

O relatório apresentado, em que pese alguns avanços, trouxe no seu seio uma enorme incoerência, a qual possui riscos políticos para a execução do PNE.

A principal polêmica do debate do PNE foi sobre qual percentual de investimento do PIB deveria ser estipulado na lei para a próxima década.

1.      O projeto original enviado pelo Executivo propunha 7% do PIB para a educação;

2.      A Câmara, por pressão da sociedade civil, aprovou 10% do PIB para a educação pública;

3.      O Senado, por pressão governamental, aprovou 10% do PIB para a educação, retirando a palavra pública e explicando que entrariam na conta todos os gastos das esferas públicas com o setor privado (conforme redação do parágrafo 5º do artigo 5º do Substitutivo);

E qual foi a saída encontrada por Vanhoni? Ele manteve no seu relatório o texto anteriormente aprovado na Câmara e, ao mesmo tempo, manteve a redação do referido parágrafo. Assim, o texto final do PNE ficará com a seguinte contradição:

1.      Na redação da Meta 20 teremos a determinação de que o Brasil deve “ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto - PIB do País no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio”.

2.      No artigo 5º manteve a redação que afirma que “O investimento público em educação a que se refere o art. 214, inciso VI, da Constituição Federal, e a meta 20 do anexo desta Lei, engloba os recursos aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, bem como os recursos aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213 da Constituição Federal.

Vejamos de forma mais detalhada:

1.      A Constituição Federal, no seu artigo 212 estabelece a vinculação de recursos para a educação. Estes recursos devem ser aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino.

2.      O artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias não altera a regra descrita acima, apenas subvincula parte dos recursos obrigatórios e os redistribui de acordo com as matrículas. A novidade é a complementação financeira da União, que somente 30% pode sair dos 18% obrigatórios, ou seja, acrescenta dinheiro novo para a educação básica.

3.      O artigo 213 da Constituição Federal estabelece a possibilidade de ser repassado recurso público para instituições privadas, mas condiciona tal procedimento a que tais instituições sejam comunitárias, confessionais e filantrópicas.

4.      Acontece que o parágrafo 5º acrescenta a expressão “bem como os recursos aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil”. Tais gastos não estão previstos no texto constitucional e, na verdade, parte deles não se enquadram na exceção prevista no artigo 213. Por exemplo, o financiamento estudantil abrange entidades privadas com fins lucrativos, as quais não são cobertas pelo artigo 213 CF.

Qual a intenção do relator? Dizer que escrever “educação” ou “educação pública” são coisas semelhantes, quando não são. A professora Sofia Lerche Vieira, em artigo de 2008 definiu escola pública como “aquela financiada com recursos públicos, provenientes da receita de impostos, mantidas e administradas pelas diferentes instâncias do Poder Público”. Obviamente a inclusão da expressão “pública’ faz enorme diferença no texto.

1.      Convênios do Poder Público Municipal com Escolas Comunitárias, Confessionais e Filantrópicas para atender crianças de educação infantil são constitucionais, mesmo que representem uma precarização dos serviços. Porém não transformam tais escolas em públicas.

2.      Bolsas de estudo adquiridas em instituições privadas não as transformam em públicas;

3.      Financiamento estudantil firmado entre governo federal, o aluno e uma instituição privada lucrativa, não torna pública a referida instituição.

O governo (e agora também o nobre relator) querem colocar na conta da educação pública toda o investimento feito com o setor privado por que esta tem sido a sua prioridade. Não é coincidência (no caso infeliz) que os gastos federais com o segmento público estão estagnados desde 2009 e continuam crescendo no setor privado.

 

 

sexta-feira, 21 de março de 2014

Não se pode elogiar....


Não me arrependo do elogio ao deputado Vanhoni feito logo que li o relatório apresentado por ele. Tal atitude foi presidida pela minha expectativa de que o texto seria muito ruim, totalmente alinhado com os interesses do governo.

Porém, após leitura mais atenta do texto ficou evidente que o deputado quis acender uma vela a Deus e outra ao Diabo, coisa muito perigosa e que normalmente acaba condenando a alma do executante ao Coisa Ruim, como dizia o velho Brizola.

A principal polêmica que permeou todos os debates do Plano Nacional de Educação foi (e continua sendo) a participação que a União deve ter no esforço nacional para melhorar o quadro educacional do país, que se encontra em descompasso com o nosso potencial econômico (uma das oito maiores economias mundiais).

Pois bem, esta polêmica se consolidou em alguns itens do Plano. Vejamos quais:

1.       Redação da Meta, onde temos duas polêmicas interligadas. De um lado, a necessidade de mais recursos (governo queria 7% do PIB e os Educadores lutavam por 10% do PIB). De outro lado, a luta para que o percentual seja destinado para “a escola pública” e o governo querendo incluir tudo que repassa para a “escola privada”, em quaisquer dos seus formatos (bolsas, subsídios, financiamento estudantil e isenções fiscais).

2.       Estabelecimento de prazo curto para a implantação de um padrão mínimo de qualidade, que assumiu a denominação de Custo Aluno-Qualidade e que pressupõe necessariamente um acordo para que a União complemente estados e municípios que estiverem abaixo deste patamar.

Pois bem, uma primeira leitura mostra que três modificações feitas relator mantém conquistas importantes arrancadas na tramitação da Câmara:

1.       Ele manteve a redação da Meta 11, obrigando a que o Poder Público avance na sua participação no ensino profissional;

2.       Ele manteve a redação da Meta 12, obrigando a que o Poder Público avance na sua participação no ensino superior; e

3.       Manteve a redação da Meta 20, onde está escrito que os 10% do PIB devem ser destinados para a “educação pública”.

Porém, como diz o ditado, alegria de pobre (e de educador, acrescentaria) dura pouco, o relatório manteve dispositivos oriundos do Senado que desfazem os avanços listados acima. Vejamos:

1.       Manteve o famigerado parágrafo 5º do artigo 5º, no qual ficam reconhecidos como “investimento público em educação”, além dos “recursos aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”, incorpora nesta contabilidade “os recursos aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213 da Constituição Federal”. Traduzindo: mesmo mantendo a palavra “pública” na Meta 20, o relator deixou enorme brecha para que o governo, no dia seguinte à aprovação do PNE, diga que estes outros gastos (com iniciativa privada) também farão parte da conta dos 10% do PIB.

2.       Na Câmara havíamos conseguido incluir o Custo Aluno Qualidade no texto. Mesmo que o mesmo continue no texto do Senado (e no relatório do deputado), ele foi enfraquecido, pois ao invés de estabelecer prazo de 2 (dois) anos da vigência deste PNE, para que ele seja implantado, o texto substitui essa redação por ser definido. Sabe lá quanto tempo depois dos dois anos ele será efetivamente implantado.

3.       E o mais grave, o Senado Federal havia suprimido a Estratégia 20.10 aprovada na Câmara. No seu texto estava escrito que caberia à União, na forma da lei, a complementação de recursos financeiros a todos os Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que não conseguirem atingir o valor do CAQi e, posteriormente, do CAQ. Suprimindo essa estratégia o relator atende efusivo pedido do governo, que não quer assumir compromissos em complementar estados e municípios com mais recursos, ou seja, enterra a possibilidade de existência concreta do padrão mínimo de qualidade.

Estes dias li matéria publicada no UOL, de responsabilidade da jornalista Cristiane Capuchinho, a informação de que das 291 mil vagas de ensino técnico gratuito oferecido na segunda edição do Sisutec (Sistema de Seleção Unificada para Cursos Técnicos), 84,5% são em instituições privadas (246.228). A capacidade ociosa da rede particular está sendo usada pelo governo federal para aumentar a capacitação profissional. Esse exemplo mostra que sem restringir o uso de recursos públicos para o setor privado, mesmo escrevendo que os 10% do PIB serão para a rede pública, o governo vai continuar no mesmo caminho privatizante que vem trilhando.

A mudança destes itens do relatório do deputado Vanhoni são fundamentais para que o PNE apresente clara sinalização de aumento da responsabilidade do Poder Público com a oferta educacional, postura que é condizente com o disposto em nossa Carta Magna.

Corrigir o relatório é urgente!

quarta-feira, 19 de março de 2014

A redenção parcial de Vanhoni


Depois de uma atuação complicada na primeira fase de seu trabalho de relatoria do PNE na Câmara, o deputado Ângelo Vanhoni me surpreendeu positivamente.

O embate deste momento no PNE é entre manter os avanços conseguidos na Câmara versus acatar um conjunto de retrocessos consignados pelo texto do Senado, mesmo que seja sempre possível encontrar algum avanço perdido no meio de tantas alterações realizadas pela Casa Revisora.

Pois bem, nesta fase legislativa somente é possível acatar ou rejeitar modificações feitas pelo Senado. Tudo que gostaríamos que o Senado tivesse melhorado no texto aprovado na Câmara, mas que não se realizou, não poderá ser proposto. O momento é de não perder conquistas, claramente.

Neste sentido, o relatório do deputado Vanhoni é uma grata surpresa, por que recuperou grande parte das conquistas anteriores, as quais haviam sido retiradas na batalha que travamos no Senado Federal. Destaco três muito importantes:

1.       A previsão de que o investimento educacional deva alcançar 10% do PIB ao final da década e que tal percentual seja apenas contabilizando a rede pública. O Senado havia alterado o texto para incluir neste percentual todo o gasto com subsídios, bolsas e isenções concedidas ás instituições privadas. O relator manteve o texto da Câmara.

2.       A garantia que o crescimento das matrículas do ensino profissional tenha seu acento na expansão da rede pública, quesito também retirado na tramitação do Senado.

3.       A garantia que o crescimento das matrículas do ensino superior também possuísse acento na expansão da rede pública, previsão também retirada no Senado.

Porém, em pelo menos dois aspectos considero que o relatório representa a consolidação de retrocessos importantes e, por isso, precisa ser modificado.

O primeiro diz respeito a assimilação da redação da Meta 4 aprovada no Senado, que na prática enfraquece a educação inclusiva, direito fundamental dos portadores de deficiência inscrito em nossa Constituição.

O segundo retrocesso é a concordância do relator com a supressão da estratégia 20.10 do texto aprovado na Câmara, que estabelece a obrigação da União de complementar estados e municípios que não conseguirem alcançar o Custo Aluno Qualidade. Sobre este assunto escreverei com mais clama no dia de amanhã, pois o esforço teórico de minha tese foi justamente o de mensurar o valor necessário para que o Brasil passasse a conviver com um padrão mínimo de qualidade. E é óbvio que tal esforço não pode acontecer sem um forte aporte financeiro da União.
Não acho que a melhoria da postura do deputado Vanhoni seja fruto de alguma conversão repentina aos interesses educacionais. É fruto direto do bom trabalho desenvolvido pela sociedade civil organizada durante todo o processo de tramitação da matéria no Congresso Nacional, com destaque para a atuação da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
De certa forma é contraditório que esta rede tenha tido tanto peso para melhoria do relatório nesta fase da tramitação e o relator tenha acatado a visão do setor econômico do governo em uma das principais bandeiras do movimento que é o estabelecimento de um Custo Aluno Qualidade.
Vamos acompanhar a reta final da longa novela que se transformou a elaboração do Plano Nacional de educação.

Entidades querem garantir padrão mínimo de qualidade

POSICIONAMENTO PÚBLICO
UM PNE PRA VALER EXIGE A COMPLEMENTAÇÃO DA UNIÃO AO CAQi E AO CAQ


Brasil, 18 de março de 2014.

Às vésperas da apresentação do relatório do PL 8035/2010 (Plano Nacional de Educação – PNE), a rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação reafirma sua inequívoca defesa do texto aprovado pela Câmara dos Deputados em junho de 2012, reforçando o último posicionamento público do Fórum Nacional de Educação (FNE), do qual q rede faz parte.

Assinada por todos os membros do Fórum, que congrega organizações e movimentos da sociedade civil, confederações sindicais e representantes de gestores públicos municipais, estaduais e do próprio MEC, a 21ª Nota Pública do FNE – em defesa e em respeito às deliberações da Conferência Nacional de Educação de 2010 (Conae-2010) – solicita que os deputados e as deputadas da Comissão Especial:

-    retomem o prazo de alfabetização de crianças até, no máximo, os oito anos de idade ou o terceiro ano do ensino fundamental (Meta 5);

-    efetivem o compromisso do poder público com a ampliação de matrícula pública tanto na educação técnica profissional de nível médio (Meta 11) quanto na educação superior (Meta 12);

-    retomem o princípio do investimento público em educação pública (Meta 20);

-  assegurem a implementação do Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) no prazo de dois anos após a aprovação do PNE, garantindo a complementação com recursos financeiros da União, aos Estados e Municípios que não atingirem o valor do CAQi e, posteriormente, do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) (Estratégias da Meta 20, especialmente Estratégia 20.10 da versão de PNE da Câmara);

-    consagrem o papel da sociedade civil, representada no Fórum Nacional de Educação, frente às conferências municipais, estaduais, distrital e nacional. (Artigos da Lei).

Para qualificar o debate, além de reiterar o consenso entre os membros do FNE em torno dos pontos acima mencionados, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação divulgou na semana passada um parecer legal sobre a boa técnica legislativa e a constitucionalidade da complementação da União ao Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e ao Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Escrito por Oscar Vilhena Vieira (FGV-Direito), Eloisa Machado de Almeida (FGV-Direito) e Salomão Ximenes (Ação Educativa). O documento traz novas linhas argumentativas ao que já era conhecido: o CAQi tem base constitucional, bem como a complementação da União ao mesmo.

Diante do exposto, a rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação reitera a importância da retomada do texto da Câmara dos Deputados especialmente em relação aos pontos explicitados na 21ª. Nota Pública do FNE. Ao mesmo tempo, reconhece a postura democrática dos deputados e das deputadas da Comissão Especial, que possibilitaram a abertura ao diálogo, especialmente promovida pelo presidente da Comissão, Dep. Lelo Coimbra (PMDB-ES), e pelo relator da matéria, Dep. Angelo Vanhoni (PT-PR).

Representando importante estrato da sociedade civil organizada, a Campanha reivindica que a decisão dos parlamentares garanta a promoção do direito à educação a todos os brasileiros e todas as brasileiras. Para tanto, além da reafirmação do texto da meta 20 e suas respectivas estratégias, como aprovado na emblemática sessão de junho de 2012, é fundamental que a responsabilidade pela implementação do CAQi e do CAQ não recaia exclusivamente para os gestores estaduais e municipais. Neste caso, trata-se, simplesmente, de respeito a preceito constitucional, exposto no primeiro parágrafo do Art. 211 da Constituição Federal:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.

§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
Constituição Federal de 1988- grifo nosso.

Ciente da consciência dos parlamentares sobre o impacto de sua decisão para a população brasileira e para a boa gestão da educação pública, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação espera uma decisão condizente com a envergadura da matéria. Assim, manifesta que acompanhará de perto a apresentação do relatório e a votação do mesmo, fazendo todos os esforços pela garantia de um “PNE pra Valer!”, por meio de uma decisiva participação financeira e técnica da União na educação básica. 

Assina o Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação:
Ação Educativa – Assessoria, Pesquisa e Informação
ActionAid Brasil
CCLF (Centro de Cultura Luiz Freire)
Cedeca-CE (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará)
CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação)
Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente
Mieib (Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
Uncme(União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação)
Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação).

A tabela que estava sumida


Desde que iniciou a tramitação do Plano Nacional de Educação que o INEP deixou de divulgar uma importante informação. Trata-se da Estimativa do Percentual do Investimento Público Direto em educação em relação ao Produto Interno Bruto – PIB. Traduzindo: trata-se de quanto cada esfera de governo investe em educação pública.

Finalmente este dado vem a público. Tendo que responder a requerimento de autoria do senador Randolfe Rodrigues (PSOL/AP), o Ministério da Educação informou ao parlamentar os dados que estavam guardados a sete chaves nas gavetas ministeriais desde 2010. A informação foi divulgada pelo jornalista Fernando Rodrigues no dia de hoje ( http://migre.me/ioZHs ).



O investimento direto em educação passou de 3,9% do PIB (2000) para 5,5% do PIB (2012), crescimento muito lento para as necessidades do país. Porém, a distribuição deste esforço entre as esferas de governo é bastante desigual.

Em 2000, no segundo mandato de FHC a participação da União era de 0,7% do PIB, ou dito de outra forma, participava com 17,9% dos recursos aplicados diretamente na educação pública do país. Passados dois mandatos de Lula e contabilizando dois anos de governo Dilma esta participação é de apenas 1% do PIB, o que representa no momento apenas 18,2% de participação.

Talvez por este motivo que as referidas tabelas tenham sido suprimidas do rol de indicadores disponibilizados pelo INEP. No meio de um forte questionamento sobre o quanto o país deveria aplicar em educação ser divulgado que o ente federado mais rico é o que menos contribui financeiramente, seria colocar gasolina no fogo do debate travado no Congresso Nacional.

E mais, a participação da União vinha crescendo, mesmo que lentamente, no governo Lula, especialmente após a criação do Fundeb e abertura de novas universidades e institutos tecnológicos. Acontece que este crescimento parou de existir. No último ano de Lula chegou a 1% e em 2012 continua no mesmo patamar.

Certamente estes números vão dar o que falar nos próximos dias.

A divulgação da tabela vai reacender o debate sobre o papel do governo federal no alcance das metas do novo Plano Nacional de educação. Semana que vem sai o relatório final do deputado Vanhoni (PT/PR), o qual dirá o que a Câmara aceitará ou rejeitará do que foi modificado pelo Senado.

 Destaco algumas conclusões sobre os dados e sobre as justificativas do MEC para não usar os referidos resultados:

1. A participação da União é muito menor do que seu potencial de arrecadação dos tributos dos cidadãos brasileiros. Em 2009 a União ficava com 57% dos recursos pagos por todos nós, mas o gasto com educação continua oscilando em torno de 18%, ficando nas costas dos Estados e Municípios, entes federados com menor potencial de arrecadação, especialmente os municípios.

2. A consequência deste desequilíbrio é uma oferta escolar muito diferenciada, pois a mesma está totalmente dependente dos recursos próprios de cada município, condenando os moradores das regiões mais pobres do país a receberem educação de baixíssima qualidade;

3. Quando comparamos a aplicação de recursos federais em relação ao PIB feito de forma direta (somente nas escolas públicas) e vemos a tabela de aplicação total (que acrescenta todos os gastos com subsídios, bolsas e outras formas de apoio ao setor privado) fica claras uma opção preferencial pelos ricos, pois a ajuda ao setor privado equivale a 30% do que é destinado pela União para o setor público.

4. É descabida a justificativa de que os dados compilados colocam recursos federais repassados aos municípios e aos estados, mas que efetivamente eles seriam da União.

4.1. Os dados se baseiam nas informações fornecidas para o Tesouro Nacional e para o SIOPE, os quais são permitem separar dos gastos, por exemplo, com alimentação escolar, o que foi recebido do governo federal e o que foi gasto com recursos próprios. Da mesma forma é perfeitamente possível separar o dinheiro transferido para complementar o Fundeb.

4.2. Recursos arrecadados pelo governo federal, mas que por decisão constitucional pertencem aos estados e municípios, não podem ser contabilizados como dinheiro federal. Por exemplo, o FPM é transferência constitucional para os municípios, mas não pertence ao governo federal. Aquilo que nos pertence é licito fazer o uso que nos aprouver, esse não é o caso citado. Assim como não podemos contabilizar toda receita arrecadada de ICMS como receita estadual, por que a Constituição obriga a transferência de parte obrigatoriamente para os municípios.

5. As tabelas enviadas ao senador Randolfe Rodrigues (PSOL/AP) deveriam ser públicas e transparentes. Caso o governo questione a metodologia, basta que reúna a comunidade acadêmica e áreas envolvidas e proponha outro formato, aperfeiçoe o instrumento. E nunca será aceitável que tais tabelas fiquem escondidas e só apareçam á público quando o governo se veja obrigado a fornecê-las.

6. Uma das principais polêmicas do debate no PNE é justamente qual deve ser a participação da União no esforço para o cumprimento das metas e estratégias previstas na texto. Um bom exemplo é o esforço do governo federal para retirar do texto a obrigação da União complementar as finanças estaduais e municipais quando da implantação do Custo Aluno-Qualidade. Os números mostram que o ente federado que tem gorduras pra queimar é a União e sem a sua mais efetiva participação o plano pode virar uma peça de ficção.