Como todo plano nacional de educação, o projeto de lei enviado pelo governo federal possui uma parte legal propriamente dita e um anexo onde são descritas as metas e estratégias.
O corpo da lei é composto de 12 artigos. Hoje farei breves comentários sobre os principais artigos.
A primeira observação diz respeito ao artigo 2º. Neste artigo estão descritas as diretrizes do Plano Nacional. Não tenho questionamentos sobre a relevância das dez diretrizes, com destaque para a importância de erradicar o analfabetismo, universalizar o atendimento escolar ou valorizar o magistério. Contudo, a diretriz de número 10 foi redigida da seguinte forma: “difusão dos princípios da equidade, do respeito à diversidade e a gestão democrática da educação”. Considero que não cabe ao plano nacional ter como diretriz apenas a difusão da equidade e sim apresentar mecanismos garantidores dela. O mesmo vale para a gestão democrática, que nas metas é induzida e não difundida.
Identifico um problema no arti
go 4º, onde é dito que o plano terá como referência os censos educacionais mais atualizados, o que em termos de monitoramento é uma obviedade. Poderiam ser acrescidos os dados das PNADS, por exemplo, e ainda assim estaríamos no mesmo terreno. O que faz falta é a existência de um Anexo com o diagnóstico que orientou o estabelecimento das metas e estratégias.
Infelizmente o projeto de lei não está acompanhado de pelo menos um resumo executivo de pesquisa encomendada pelo MEC e realizada em 2009. Neste trabalho coordenado pelo professor Luiz Dourado (UFG). Na introdução do primeiro volume (são três volumes e 784 páginas) é dito que a pesquisa esteve “sob a coordenação e supervisão da Secretaria Executiva Adjunta (SEA), por designação do Ministro de Estado da Educação, com o expressivo apoio do Inep”. Por que não consta do texto legal os fundamentos empíricos que levaram a opção pelas metas e estratégias? Ficará difícil fazer um juízo de valor se determinada meta é factível ou não sem estes elementos.
O artigo 5º já está gerando pelo menos duas interpretações. No texto é dito que a “meta de ampliação progressiva do investimento público em educação será avaliada no quarto ano de vigência dessa Lei, podendo ser revista, conforme o caso, para atender às necessidades financeiras do cumprimento das demais metas do PNE - 2011/2020”.
A Emenda Constitucional nº 59, ao alterar o inciso VI do artigo 214 da Carta Magna tornou obrigatória tal definição. O texto constitucional coloca como obrigatório que conste da Lei do PNE o “estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto”. Portanto, a CF remete para uma lei tal definição. Uma leitura possível da redação do artigo proposto é que o Congresso delegará ao governo a possibilidade de revisar a meta aprovada. Ora, a Constituição não autoriza tal subdelegação e uma revisão pode ser para aumentar (como afirmou o Ministro da Educação no dia de ontem) ou para diminuir (uma crise fiscal pode forçar ajustes drásticos, por exemplo). E quem fará tal ajuste não fica claro na redação do artigo.
Um dispositivo muito interessante é o que consta do artigo 6º. Está escrito:
Art. 6º. A União deverá promover a realização de pelo menos duas conferências nacionais de educação até o final da década, com intervalo de até quatro anos entre elas, com o objetivo de avaliar e monitorar a execução do PNE – 2011-2020 e subsidiar a elaboração do Plano Nacional de Educação para o decênio 2021-2030.
Parágrafo único. O Fórum Nacional de Educação, a ser instituído no âmbito do Ministério da Educação, articulará e coordenará as Conferências Nacionais de Educação previstas no caput.
É uma incorporação de uma das principais propostas da CONAE. Ter nas Conferências Nacionais de Educação, coordenadas por um Fórum Nacional de Educação é uma medida democratizadora e de controle social importante.
Apenas vislumbro um problema: faltam metas intermediárias no plano, situação que dificultará a definição de critério técnico para julgar o quanto o plano está sendo cumprido daqui a quatro anos. Várias metas enfrentarão esta dificuldade. Por exemplo, a meta 12 propõe que seja elevada a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta”. Quanto deve ser alcançado em quatro anos para que se considere que o plano está sendo cumprido?
Como que justificando a pouca concretude do quesito “regime de colaboração” no Anexo de metas, o parágrafo 1º do artigo 7º afirma que as estratégias definidas na Lei “não elidem a adoção de medidas adicionais em âmbito local ou de instrumentos jurídicos que formalizem a cooperação entre os entes federados”. Este parágrafo é redundante em relação ao que já foi escrito na Constituição Federal em 2006 (Emenda nº 53). O que se precisa é de mais solidez no texto do plano sobre como serão divididas as responsabilidades para que sejam alcançadas as metas propostas.
No artigo 8º é estabelecido o prazo de um ano para a elaboração de planos estaduais e municipais, sendo que a lei permite que sejam apenas adaptados planos recentemente aprovados pelos entes federados. Esta redação é bem mais precisa do que a do plano anterior.
Uma novidade interessante é a obrigação de que os estados, distrito federal e municípios aprovem leis disciplinando a gestão democrática no prazo de um ano. Nas metas será estabelecida a comprovação do cumprimento desta meta como pré-requisito para receber transferências voluntárias do governo federal, o que é um poderoso instrumento de indução ao cumprimento deste dispositivo.
Considero que no artigo 11 há uma grande ausência, que será sentida no decorrer do texto do Anexo de Metas. O custo aluno-qualidade (CAQ), que foi um eixo transversal das deliberações da CONAE, simplesmente sumiu do Plano Nacional de Educação. Aparece claramente no final do Anexo, apenas para registrar que o governo terá 10 anos para estabelecê-lo. E poderia ter sido aproveitado o artigo 11, que trata do IDEB e delega ao INEP a construção de “outros indicadores de qualidade relativos ao corpo docente e à infra-estrutura das escolas de educação básica”, para estabelecer um prazo para a consolidação do CAQ.
Amanhã começarei a comentar as metas e estratégias, parte mais significativa do Plano.
Um comentário:
Com a Lei de Responsabilidade Educacional impedirá que Municípios como o Rio de Janeiro realizem "concursos arapuca" para Educação Infantil com intuito de explorar Educadores incautos como os Agentes Auxiliares de Creche.
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