sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O que diferencia os dois cálculos (MEC versus Campanha)?

Esta certamente é uma pergunta muito relevante e quem sabe a mais importante para quem quiser compreender o que está em jogo no debate do novo PNE.

O que separa as duas propostas não são polêmicas novas no debate educacional. Pelo contrário, vivenciar o atual momento me faz lembrar o grande papel desempenhado por Florestan Fernandes em batalhas anteriores. Espero que o exemplo de coerência deste grande defensor da escola pública e gratuita inspire cada vez mais a ação dos movimentos sociais e dos parlamentares de esquerda na atual batalha.

A primeira diferença é na forma de calcular o custo aluno de cada etapa e modalidade. É uma diferença importante, mesmo que não seja a principal. O MEC utiliza dados extraídos do SIOPE. Este Sistema recolhe informações sobre educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos dos estados e municípios. Porém, recente pesquisa desenvolvida pela Undime, que tive a oportunidade de coordenar, mostrou o quanto distorcido são esses números, especialmente os relativos à educação infantil e EJA.

A segunda diferença, essa sim a fundamental, diz respeito ao eixo de crescimento da oferta de vagas na próxima década. A planilha do MEC trouxe explicitamente uma concepção de que a expansão do ensino superior deve continuar sendo majoritariamente privada (de preferência subvencionada pelo poder público), estabelece uma opção por estimular igual modelo no ensino profissionalizante e abre brechas pra continuidade de uma rede precária na educação infantil (escolas comunitárias).

A Campanha, coerente com as resoluções principais da CONAE e com a tradição do movimento educacional brasileiro, caminha em direção oposta. A expansão das matrículas deve ser prioritariamente pública, pois trabalha com o conceito de educação como direito de todos e dever do Estado (já li algo muito semelhante em alguma Carta Magna de algum país latino americano!). Apresentou emendas para que 80% da expansão do ensino profissionalizante seja público e 60% da expansão no ensino superior.

A tentativa teórica de quebrar fronteiras que sempre foram nítidas entre estes dois conceitos teve grande expressão no governo FHC, esteve presente no governo Lula e parece que não foi abandonada pelo governo Dilma.

A planilha do MEC é coerente com a “cláusula pétrea” dos governos brasileiros de que a verdadeira prioridade de gastos é o pagamento dos juros e amortização da dívida pública, mantendo contentes nossos credores especuladores do mercado financeiro. Por isso é necessário realizar malabarismos na planilha apresentada, contanto que ao final os números apresentem resultado que não mexa com a prioridade estabelecida. A defesa explícita feita na Nota técnica do MEC é de que basta manter o crescimento registrado de gasto público dos últimos quatro anos para resolvermos os principais problemas educacionais. Na verdade, não acho que existam pessoas que acreditem neste discurso, mas ele ajuda a justificar as escolhas.

A Campanha aponta para uma dinâmica diferenciada. Ao elaborar a proposta de Custo Aluno-Qualidade esta rede de entidades propôs que o país verificasse primeiro qual o padrão mínimo de qualidade compatível com o direito a educação para todos e aceitável para o nível de desenvolvimento nacional e que os recursos necessários para se atingir este objetivo fossem priorizados, seja pela justiça social embutida nesta decisão, seja pelo efeito benéfico da elevação da escolaridade da população para o próprio desenvolvimento nacional.

São muitas diferenças e é preciso que cada cidadão pressione os parlamentares de seu estado para que reforcem o lado correto deste debate.

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