terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Irresponsabilidade crônica


A principal contribuição do governo federal para a manutenção da educação básica em nosso país não está ancorada em programas de alimentação ou transporte, muito menos no gasto com distribuição de livros didáticos. E, obviamente, não são os 54 milhões desperdiçados nas chamadas escolas cívico-militares.
Desde 2007 que o governo federal é obrigado por força constitucional a complementar com 10% do montante bloqueado dos estados e municípios pelo Fundeb. Este recurso está salvo, por força legal, de cortes orçamentários e representou um desembolso de 15 bilhões no ano passado. E é fundamental para elevar o valor por aluno disponível em nove estados, especialmente faz enorme diferença no Pará e no Maranhão, estados que possuem os valores mais baixos, caso disponham apenas com recursos educacionais próprios.
Pois bem, o Fundeb perde sua validade no dia 31 de dezembro de 2020 e no seu primeiro ano de gestão, o senhor Weintraub fez de conta que não era uma demanda importante, não apresentou nenhum estudo consistente e nem enviou nenhuma proposta do novo governo para o Congresso Nacional. Apenas um oficio assinado pela sua assessoria parlamentar, dando alguns pitacos sobre uma minuta de substitutivo em debate na Câmara dos Deputados.
Para não ser injusto, às vésperas do início da tramitação das 3 Propostas de Emendas Constitucionais que mexem com o pacto federativo, uma das minutas que circulou nos corredores do Congresso Nacional propunha adiar por um ano a vigência da Emenda Constitucional nº 53, jogando para adiante a decisão sobre mudanças no formato do fundo e desconsiderando todo o debate do parlamento e todas as contribuições feitas pelos gestores estaduais e municipais, pesquisadores e entidades da sociedade civil brasileira. Depois, por encanto, essa proposta foi retirada.
Agora, depois de ser questionado pela ausência de proposta, o ministro decidiu gravar um vídeo na sua conta pessoal do twiter para afirmar que vai enviar uma Proposta de Emenda redigida pelo governo. Aproveitou também para chamar de demagogos todos os que ajudaram a construir o substitutivo apresentado pela deputada Dorinha e o texto apresentado por duas dezenas de senadores.
No referido vídeo diz que os que defendem elevar para 40% a participação da União são os mesmos responsáveis pelo desequilíbrio fiscal do país.
´Depois de um ano de omissão, o governo decidiu ser irresponsável. Quer que todo o processo legislativo se reinicie, isso em um ano em que o parlamento consegue quórum somente no primeiro semestre, por ser ano eleitoral e numa matéria que precisa para ser aprovada de:
1. Uma votação de admissibilidade na CCJ da Câmara.
2. A tramitação e aprovação do texto em uma comissão especial.
3. Duas votações com três quintos dos deputados na Câmara.
4. Tramitar nas Comissões do Senado Federal.
5. Duas votações com três quintos de votos dos senadores.
6. Possível retorno para nova votação na Câmara, caso os senadores alterem parte do texto.
7. Aprovação de uma lei regulamentadora pelas duas Casas.

Tudo o que descrevo acima até 31 de dezembro de 2020.
Não conhecemos a proposta do governo, talvez nem o ministro a conheça, pode ser que neste momento algum assessor esteja fazendo um curso intensivo sobre o tema e redigindo às pressas o texto. Mas certamente será uma proposta rebaixada em termos de destinação de recursos, diminuindo o impacto benéfico para a melhoria da qualidade da educação brasileira que o texto em debate na Câmara apresenta.
Considero que tudo isso é uma jogada para embaralhar o jogo e forçar o Congresso Nacional a adiar o fundo atual sem nenhuma mudança, tudo em nome do ajuste fiscal de Guedes/Bolsonaro. Jogada combinada.
Ahh, antes que me esqueça, considero subestimado o valor de arrecadação prevista para o Fundeb para 2020. Considerando a atualização de estimativa feita pelo governo em dezembro, a receita do fundo entre 2018 e 201º9 cresceu 10,6%. E agora o governo quer nos convencer que em 2020 a variação será de apenas 4,2%.
Ou tem uma baita crise fiscal sendo escondida do povo brasileiro ou o governo quer economizar nos valores de complementação e, no final do ano, vai fazer o ajuste para os valores realmente esperados. Na segunda hipótese (espero que seja a mais provável) estamos diante de um roubo de recursos tão necessários para o cotidiano de milhões de alunos localizados nos estados contemplados com a ajuda federal (Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Bahia).


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