sexta-feira, 21 de março de 2014

Não se pode elogiar....


Não me arrependo do elogio ao deputado Vanhoni feito logo que li o relatório apresentado por ele. Tal atitude foi presidida pela minha expectativa de que o texto seria muito ruim, totalmente alinhado com os interesses do governo.

Porém, após leitura mais atenta do texto ficou evidente que o deputado quis acender uma vela a Deus e outra ao Diabo, coisa muito perigosa e que normalmente acaba condenando a alma do executante ao Coisa Ruim, como dizia o velho Brizola.

A principal polêmica que permeou todos os debates do Plano Nacional de Educação foi (e continua sendo) a participação que a União deve ter no esforço nacional para melhorar o quadro educacional do país, que se encontra em descompasso com o nosso potencial econômico (uma das oito maiores economias mundiais).

Pois bem, esta polêmica se consolidou em alguns itens do Plano. Vejamos quais:

1.       Redação da Meta, onde temos duas polêmicas interligadas. De um lado, a necessidade de mais recursos (governo queria 7% do PIB e os Educadores lutavam por 10% do PIB). De outro lado, a luta para que o percentual seja destinado para “a escola pública” e o governo querendo incluir tudo que repassa para a “escola privada”, em quaisquer dos seus formatos (bolsas, subsídios, financiamento estudantil e isenções fiscais).

2.       Estabelecimento de prazo curto para a implantação de um padrão mínimo de qualidade, que assumiu a denominação de Custo Aluno-Qualidade e que pressupõe necessariamente um acordo para que a União complemente estados e municípios que estiverem abaixo deste patamar.

Pois bem, uma primeira leitura mostra que três modificações feitas relator mantém conquistas importantes arrancadas na tramitação da Câmara:

1.       Ele manteve a redação da Meta 11, obrigando a que o Poder Público avance na sua participação no ensino profissional;

2.       Ele manteve a redação da Meta 12, obrigando a que o Poder Público avance na sua participação no ensino superior; e

3.       Manteve a redação da Meta 20, onde está escrito que os 10% do PIB devem ser destinados para a “educação pública”.

Porém, como diz o ditado, alegria de pobre (e de educador, acrescentaria) dura pouco, o relatório manteve dispositivos oriundos do Senado que desfazem os avanços listados acima. Vejamos:

1.       Manteve o famigerado parágrafo 5º do artigo 5º, no qual ficam reconhecidos como “investimento público em educação”, além dos “recursos aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”, incorpora nesta contabilidade “os recursos aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213 da Constituição Federal”. Traduzindo: mesmo mantendo a palavra “pública” na Meta 20, o relator deixou enorme brecha para que o governo, no dia seguinte à aprovação do PNE, diga que estes outros gastos (com iniciativa privada) também farão parte da conta dos 10% do PIB.

2.       Na Câmara havíamos conseguido incluir o Custo Aluno Qualidade no texto. Mesmo que o mesmo continue no texto do Senado (e no relatório do deputado), ele foi enfraquecido, pois ao invés de estabelecer prazo de 2 (dois) anos da vigência deste PNE, para que ele seja implantado, o texto substitui essa redação por ser definido. Sabe lá quanto tempo depois dos dois anos ele será efetivamente implantado.

3.       E o mais grave, o Senado Federal havia suprimido a Estratégia 20.10 aprovada na Câmara. No seu texto estava escrito que caberia à União, na forma da lei, a complementação de recursos financeiros a todos os Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que não conseguirem atingir o valor do CAQi e, posteriormente, do CAQ. Suprimindo essa estratégia o relator atende efusivo pedido do governo, que não quer assumir compromissos em complementar estados e municípios com mais recursos, ou seja, enterra a possibilidade de existência concreta do padrão mínimo de qualidade.

Estes dias li matéria publicada no UOL, de responsabilidade da jornalista Cristiane Capuchinho, a informação de que das 291 mil vagas de ensino técnico gratuito oferecido na segunda edição do Sisutec (Sistema de Seleção Unificada para Cursos Técnicos), 84,5% são em instituições privadas (246.228). A capacidade ociosa da rede particular está sendo usada pelo governo federal para aumentar a capacitação profissional. Esse exemplo mostra que sem restringir o uso de recursos públicos para o setor privado, mesmo escrevendo que os 10% do PIB serão para a rede pública, o governo vai continuar no mesmo caminho privatizante que vem trilhando.

A mudança destes itens do relatório do deputado Vanhoni são fundamentais para que o PNE apresente clara sinalização de aumento da responsabilidade do Poder Público com a oferta educacional, postura que é condizente com o disposto em nossa Carta Magna.

Corrigir o relatório é urgente!

Um comentário:

J disse...

Só mais um "plano de faz de conta", mais do mesmo: NADA!!!! Enquanto isso é greve de professores escravizados por todo o Brasil.