quinta-feira, 7 de maio de 2015

Os limites do Fundeb e o Custo Aluno-Qualidade

Informações que me chegam dão conta de que em setores governamentais há uma tendência em associar o Custo Aluno-Qualidade aos parâmetros já existentes no funcionamento do Fundeb.
O raciocínio subjacente é que o Fundeb seria o que de mais avançado seria possível fazer em termos redistributivos e nele estaria embutido uma eficaz política de diminuição das desigualdades entre municípios e entre estados. Ou seja, o ponto de partida para o padrão mínimo de qualidade seria o valor por aluno do Fundeb.
O que está escondido neste discurso?
1.       Na época do Fundef, a lei nº 9424/1996 estabelecia que a participação da União deveria ser equivalente à média dos valores per capita encontrados em cada fundo estadual. Como este valor médio (por óbvio) significaria uma lista significativa de fundos a serem complementados, de forma sistemática o MEC descumpriu a norma e depositou no Fundef valores bem abaixo do que seria necessário.
2.       Nestes oito anos de Fundeb vivemos uma mudança na forma de cálculo, passando a participação da União ser baseada em percentual fixo (no mínimo 10%) dos montantes depositados pela soma dos fundos estaduais. Assim, o valor da complementação é redistribuído para os fundos estaduais com menores per capitas. A situação melhorou se comparado o número de estados contemplados nos anos de Fundef e também cresceu de valor (último valor do Fundef girou em torno de 400 milhões e hoje trabalhamos na casa de 9 a 10 bilhões).
3.       A lógica embutida no discurso de encontrar equivalência entre CAQ e Valor por Aluno do Fundeb é de que já existe um patamar aceitável para os gastos educacionais, ou seja, o padrão mínimo de qualidade já foi alcançado via o Fundeb, o que tornaria praticamente desnecessário ter aprovado a criação de um instrumento para mensurá-lo no PNE.
Existe vários problemas graves nesta avaliação, que infelizmente vem crescendo no seio da bancada governista e no MEC na mesma proporção que aumentam as dificuldades de financiamento da máquina estatal e se vão fazendo sentir os efeitos do ajuste fiscal.
Em primeiro lugar, os efeitos redistributivos do Fundeb são conhecidos, mas são por demais valorizados, para além do que os números e pesquisas apontam. Este fenômeno aconteceu também durante a vigência do Fundef. Realmente os fundos ajudaram a diminuir as desigualdades de oferta dentro de cada estado, dentro do universo de recursos bloqueados em cada época. Eles não ajudam a captar toda a desigualdade existente, seja por que trabalham apenas com o bloqueio e redistribuição de parte dos recursos existentes, seja por que não utilizam como parâmetro quaisquer exigências de padrão de oferta dos insumos educacionais.
Em segundo lugar, a lógica do Fundeb estás baseada em mensurar um valor por aluno que não é produto de nenhum padrão de qualidade acordado. O valor por aluno representa o custo “possível” levando em conta os recursos bloqueados pelo próprio fundo. Nem é o que seria necessário para que as escolas obedecessem a padrões aceitáveis e acordados, nem representa o custo real aplicado nas referidas escolas. Em minha tese de doutorado e estudos feitos por outros pesquisadores ficou demonstrado que as distâncias entre as condições de oferta escolar dependem do perfil de cada ente federado, do potencial de arrecadação deles e que a participação do Fundeb é pequena diante do total dos recursos disponíveis em cada um deles. Em 2011 esta participação representava apenas 14% da Receita Corrente Municipal.
Em terceiro, como a lógica é encontrar um per capita estadual, a lógica do fundo não leva em consideração as desigualdades de oferta, podendo conviver no mesmo estado (de per capita igual e teoricamente recebendo recursos iguais) redes muito distintas. Para comprovar tal situação basta analisar os dados do censo escolar e verificar diferentes perfis escolares dentro do mesmo estado. Estados pobres como a Bahia possui redes escolares com presença muito distinta de insumos essenciais em qualquer padrão aceitável de qualidade que seja utilizado.
A lógica do Custo Aluno-Qualidade, idealizado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, é totalmente diferente. Ela parte da construção de um patamar de oferta de insumos indispensáveis em cada escola e na mensuração do valor por aluno necessário para financiar tal padrão. E, a partir desta definição, busca calcular o quanto é necessário que cada estado ou cada município aplique em educação para dar conta do referido padrão.
Mas se isto parece tão óbvio, por que tem crescido esta linha esdruxula de associação entre Fundeb e padrão de qualidade? É simplesmente uma tentativa de enquadrar o texto do PNE às contingências orçamentárias de um país presidido por uma política de ajuste fiscal.



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