Analisei rapidamente as duas
pesquisas disponíveis (XP Investimentos e Atlas) até o momento sobre os impactos
da crise recente na avaliação do governo Bolsonaro e na economia. Não tenho condições
de ajuizar erros ou acertos da metodologia das pesquisas, mas captar indicações
e movimentações no humor do brasileiro que elas apresentam.
Apesar de não ser correto
comparar pesquisas com prováveis diferenças nas metodologias, como as duas
foram feitas no mesmo período, diferenças de resultados chamam a atenção. As
duas fizeram a coleta entre 16 e 18 de março de 2020.
Os resultados de avaliação do
governo federal mostram resultados contraditórios. A XP captou uma estabilidade
de avaliações negativas (ruim e péssimo) em 36%, mas apresenta um crescimento
de 2% na avaliação regular e queda na avaliação positiva (bom e ótimo) de 4%.
Contudo, essa avaliação positiva continua na casa de 30%.
A Atlas apresenta um crescimento da
avaliação negativa (de 38% para 41%) e uma queda na avaliação positiva (de 29%
para 26%) e crescimento do regular (de 31% para 33%).
De qualquer forma as duas
apresentam um impacto negativo para o governo. Normalmente uma pessoa que
considera positivo não migra direto para o negativo. Então, usando as duas,
podemos dizer que o governo perdeu 4% de apoio até o momento. É uma tendência de
queda e que havia sido estancada no meio do ano passado quando chegou ao
patamar de 30%.
O que levou a essa primeira
queda? Os dados das duas pesquisas dão indicações e como são fenômenos que
tendem a se agravar, podem induzir uma previsão de continuidade da queda. É
verdade que não houve divulgação de perguntas diretas sobre a migração, mas os
dados a seguir mostram caminhos para explicar a queda.
Em primeiro lugar, o lento
crescimento do otimismo com a economia sofreu drástica reversão. O sentimento é
de que a vida vai piorar, vamos ter recessão e seus efeitos vão alcançar os
entrevistados. A Pesquisa XP encontrou queda de 47% para 38% na expectativa
positiva e uma expectativa de 76% de que serão atingidos pela crise. A Atlas
achou 49,7% afirmando que vai piorar diante de 28,3% anteriores. Encontrou
certeza de recessão em 57% dos entrevistados.
Em segundo lugar, sobre o combate
a pandemia as pesquisas são divergentes. A XP apresenta uma avaliação sobre
condução do governo que não é tão ruim como pode parecer ao senso comum. Temos
40% considerando boa a conduta do governo, sendo um pouco melhor o do ministro
da saúde e um pouco pior a do ministro da economia. Uma minoria acha péssima a
ação do governo.
Contudo a pesquisa Atlas,
perguntando direto se a população aprova ou não o plano de combate, a resposta
foi de 64% de desaprovação. Lembro que foi somente após a coleta e de forma
tardia que o governo começou de forma ostensiva, inclusive com participação do
presidente, a apresentar medidas econômicas para a crise. Talvez seja um
problema no formato de como as perguntas foram formuladas.
Temos também dados mostrando
rejeição a manutenção de manifestações de rua do dia 15, mas não houve
perguntas diretas sobre a participação do presidente, podendo se deduzir que
parte do comportamento captou tal atitude, mas difícil de mensurar o quanto de
conhecimento do fato estava evidente nos dias seguintes a referida participação.
A pesquisa Atlas perguntou sobre
o impeachment. O resultado é coerente com o resultado encontrado sobre
avaliação negativa e positiva. Cresceu 6% o apoio a medida.
Resumindo:
Há dados de queda da popularidade
do governo Bolsonaro, motivadas pela piora das expectativas com a economia e
com os efeitos concretos da crise na vida das pessoas. Quatro pontos de queda
em um mês é um fenômeno significativo, mas ainda não pode ser afirmado que é
uma reversão da estabilidade alcançada no segundo semestre do ano passado.
Como o elemento aparentemente
detonador mais claro é a crise econômica e a expectativa é de piora para o
próximo período (infelizmente é mais do que uma simples expectativa), a
tendência de que a população culpe o governo pelos efeitos (desemprego, redução
de renda etc.) é bastante forte. É lógico que políticas governamentais que
minimizem a crise econômica podem frear tal desgaste, mas dificilmente
revertê-lo.
Até agora as pesquisas não
captaram diretamente um desgaste associado a condução especifica do enfrentamento
a pandemia, sendo os resultados das duas pesquisas inconclusivos. Há, porém,
uma evidência que contraria o quadro geral: a aceitação dos governadores
melhorou, caindo a negativa de 31% para 27% e a positiva subindo de 23% para
26%. Talvez a postura de alguns governadores de tomar medidas proativas
explique tal melhora. O que pode nos levar a encarar que uma boa condução da
crise sanitária pode recuperar pontos do governo federal (ou piorar a situação
diante do agravamento da crise).
Não dá para afirmar ainda que o
governo se encontra em isolamento, como o senso comum na esquerda tem afirmado
a partir dos panelaços, mas podemos afirmar que mantendo a atitude atual sobre
o combate ao vírus, a crise se aprofundando e as previsões desastrosas no campo
da economia acontecendo, uma piora mais significativa que diminua o percentual
de apoio, caindo do patamar histórico de 30% é algo provável.
O crescimento mais acelerado do
desgaste e um clima de insatisfação contínuo pode colocar, a médio prazo, o
impeachment na ordem do dia. Não é o caso agora. Sem esse derretimento não
teremos migração do centro de sua base de apoio.
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