quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Dois exemplos preocupantes

O portal do MEC disponibiliza dados que revelam a situação preocupante da educação infantil em nosso país. Comparei os dados de cobertura de duas cidades bem diferentes: Distrito Federal e Belém do Pará.

Utilizando dados de 2010 mostram que o Distrito Federal possuía 20585 alunos matriculados em creche, mas destes apenas 1586 estavam em escolas públicas, ou seja, apenas 7,7% dos atendidos. É uma das mais baixas coberturas públicas do país.

A situação é mais grave quando comparamos os dados populacionais e vemos que apenas 13,7% das crianças na idade estão inseridas no sistema escolar. Ou seja, somente a classe média e rica está estudando em creches no Distrito Federal.

No outro extremo podemos citar a cidade de Belém. A cobertura escolar em creche é ridícula na capital do Pará: apenas 5,4% das crianças de zero a três anos estão matriculadas em creche. Porém, diferente do DF, nesta cidade a maior responsabilidade é do poder público, que é responsável por 72,1% das matrículas. Ou seja, apesar de poucos terem acesso a escola, provavelmente a oferta de creche em Belém seja mais justa socialmente, pois as creches municipais atendem quase que exclusivamente os mais pobres, moradores das periferias da metrópole da Amazônia.
Dados de 2009 apontavam para uma cobertura nacional de 18,4% e a participação da rede pública no total de matrículas de 2010 foi de 66,6%.

Apesar de mais rico o Distrito Federal é bem mais injusto do que a cidade de Belém. Mas ambos estão bem abaixo da média de cobertura nacional e terão enorme tarefa para alcançar pelo menos a meta prevista no PL nº 8035/2010, ou seja, garantir vaga para metade das crianças de zero a três anos até 2020.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

União decide intervir na Lei do Piso

A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados rejeitou nesta quarta-feira (23) o substitutivo do Senado ao Projeto de Lei 3776/08, do Executivo, que estabelece nova regra para o reajuste do piso salarial nacional dos professores da educação básica da rede pública.

O relator na comissão, deputado José Guimarães (PT-CE), votou pela incompatibilidade e inadequação financeira do substitutivo do Senado. Ele argumentou que o reajuste proposto pela casa revisora deixa de considerar a capacidade financeira dos entes da Federação.

Esta discussão se arrasta desde 2008. Logo após a aprovação da Lei do Piso o governo federal entrou com projeto propondo alteração na sistemática de reajuste do piso. A intenção do governo era derrubar o reajuste pela variação do custo-aluno do FUNDEB para tornar a correção atrelada ao INPC.

Esta proposta passou pela Câmara, mas sofreu substantiva mudança no Senado. Depois de intensa negociação, da qual participaram entidades de trabalhadores, secretários de educação e o governo, aquela Casa aprovou um substitutivo que mantinha reajuste do piso atrelado à variação do custo-aluno, mas seria pelo custo-aluno efetivo e a data de reajuste passaria a ser maio.

De volta para a Câmara o projeto estava sendo aprovado em todas as comissões, mas de repente vem esta votação na CFT e o parecer do deputado José Guimarães (PT-CE). Tudo indica que seu voto representa uma mudança de postura do governo federal. Por quê?

1. No parecer o principal argumento para voltar atrás do acordo firmado no Senado é que a “depender de uma variação elevada do sobredito índice, a União pode vir a assumir o ônus de complementar o FUNDEB no que tange à integralização do piso salarial em comento, nos casos em que os entes federativos não tenham disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado”. Em outras palavras, sendo um reajuste maior do que a inflação os governadores e prefeitos vão pressionar o governo federal para auxiliá-los na tarefa de pagar o piso. E isso o governo federal não quer.

2. Este argumento deve ser untado com o fato de que a correção do piso para 2012 será de algo em torno de 22% e a inflação oficial não ultrapassará 6%. A mudança ajudará governadores e prefeitos, mas prejudicará os trabalhadores em educação.

3. Na maior parte das greves feitas pelos docentes eles sempre ouviram dos governadores que não possuíam recursos e que a culpa era do MEC que não estava ajudando eles.

Fiquei curioso em saber qual será a posição das entidades (sindicais e de secretários) que patrocinaram o acordo no Senado. Especialmente acho importante ocorrer uma manifestação clara contrária a este recuo do governo federal por parte da entidade dos trabalhadores. Afinal cabe a ela defender sempre maiores salários aos seus associados.

De recuo em recuo...

Parece que mais uma vez será adiada a leitura do relatório do deputado Ângelo Vanhoni sobre o PNE. Já perdi a conta de quantos adiamentos registrei aqui neste espaço virtual, mas o mais importante é descobrir as motivações dos sucessivos adiamentos.

Bem, de qualquer forma, tornou-se público (pelo menos na internet) uma versão do relatório datada de 9 de novembro, ou seja, de um mês atrás. É difícil saber o quanto o conteúdo desta versão será mantido quando da apresentação formal do relatório, mas uma leitura atenta do mesmo pode dar algumas pistas sobre a postura do deputado em relação às emendas da sociedade civil e principalmente sobre as polêmicas principais do debate.

1º. Como era de se esperar, a versão que circulou melhora um pouco o teor do Projeto de Lei enviado pelo Executivo. É óbvio que pior não poderia ficar, mas registro que também está bem distante dos conceitos e proposições principais apresentadas pela sociedade civil.

2º. O relator pretende avançar naquelas questões menos polêmicas e que não envolvem dispêndio de recursos, ou seja, o relatório avança em aspectos democratizantes. Amplia a participação da sociedade nas definições e no monitoramento do plano.

3º. Mesmo que parcialmente o relator incorpora percentuais de participação pública em algumas etapas educacionais. Isso é claro no ensino superior e profissional. Talvez essa seja um dos motivos do atraso e da dificuldade de contar com o aval do Palácio do Planalto para o texto que circulou.

4º. Há uma clara posição recuada no que diz respeito aos aspectos privatistas inseridos no PL nº 8035/2010. O relator não enxergou problema em manter o conveniamento de escolas comunitárias para o atendimento em creche, destinação de recursos para setores privados no ensino profissionalizante, por exemplo.

5º. A parte do financiamento é uma tentativa de servir a dois senhores. Apresenta um percentual intermediário (8,29%), mas não incorpora o termo “pública” para a destinação do recurso alocado. Certamente este é outro tema que deve estar atrasando a apresentação do relatório.

6º. O regime de colaboração continua sendo um fantasma a vagar pelo plano nacional, sem nunca conseguir se materializar. Sem essa materialização não é possível distinguir qual deve ser a participação de cada ente federado, apontando implicitamente para a continuidade da distorção atual (União com apenas 20% dos recursos gastos em educação).

Como acho o texto insuficiente é óbvio que considero como mais presente a possibilidade de um relatório ainda mais recuado. Qual o interesse do governo em segurar o texto? Certamente diminuir as despesas de responsabilidade da União que o relator tenha incorporado.

Toda a atenção da sociedade civil, mobilização e pressão são fundamentais nesta hora. Por que de recuo em recuo teremos um PNE que não esteja à altura dos desafios da educação brasileira.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Educação infantil em risco

Na semana passada tive a oportunidade de participar do XXVII Encontro Nacional do Movimento Interforuns de Educação Infantil do Brasil. O evento se realizou em Salvador (BA).

Sai do evento com a certeza de que uma concepção progressista de educação infantil está sendo duramente atacada e o modelo de atendimento público para as crianças de zero a cinco anos corre sério risco em nosso pais.

Das etapas da educação básica a educação infantil é a que encontramos ainda a menor cobertura (creche com apenas 18%), E este atendimento [e muito pequeno nos estratos mais pobres da população.

É neste segmento que encontramos a maior presença da iniciativa privada. Dados de 2010 mostram que 34,4% da oferta de creche e 23,8% da oferta de pré-escola foi feita por entidades particulares. Do total de matrículas registradas no FUNDEB em 2011 nada menos que 8% foram privadas.

Quando verificamos os dados de formação dos docentes é na educação infantil que registramos o maior percentual de professores sem nível superior (52%). Caso nosso olhar seja direcionado para a Região Nordeste este percentual de não habilitados chega a 72%.

Quando pensamos na valorização salarial dos docentes também é na educação infantil que encontramos uma maior incidência de precarização das relações de trabalho. Em muitos municípios o professor de educação infantil é contratado com o nome de auxiliar de creche, assistente de creche, monitor, educador infantil, menos como professor. Agindo assim estes municípios tentam fugir da responsabilidade de pagar o piso salarial nacional do magistério, estabelecem carreiras diferenciadas, dentre outras arbitrariedades.

E recentemente a SAE – Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo federal promoveu um seminário pra propor fazer avaliação em larga escala para as crianças da educação infantil. Esta idéia foi frontalmente repudiada por todos os estudiosos sérios sobre o tema, mas parece que conta com simpatias dentro do governo.

Assim como o restante da educação o atendimento de zero a cinco anos também está no debate do novo PNE. No próximo dia 23 a sociedade conhecerá finalmente o relatório do deputado Ângelo Vanhoni.

Espero que neste assunto e nos demais o referido texto não seja decepcionante. O PNE é uma excelente oportunidade para reafirmar o compromisso do pais com o conceito de educação como direito de todos e dever do Estado, incluindo a educação infantil como parte inseparável desta conquista democrática.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O que não foi dito pelo governo e pela mídia

Os releases do MEC acerca dos resultados do censo do ensino superior de 2010 realizaram uma verdadeira tortura nos números aferidos. O mote da propaganda oficial foi de que na vigência do plano nacional de educação anterior as matrículas no ensino superior cresceram 110%. Isso é verdade, mas é apenas um aspecto da verdade.

Em 2001 as matrículas públicas representaram 31,1% do total, sendo que as universidades federais somavam 16,6%. O setor privado abocanhava 68,9% das matrículas. Diante deste quadro o Congresso Nacional aprovou no PNE que, ao final da década, a participação pública deveria ser de pelo menos 40%. Este dispositivo foi vetado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Durante oito anos o presidente Lula não fez nenhum esforço para derrubar o veto.

Pois bem, e qual foi o saldo de dez anos? A participação pública caiu para 25,8%, caindo também percentualmente a participação das instituições federais (agora representando apenas 14,7% do total).

O governo festeja um crescimento das matrículas federais durante o governo Lula. Os dados divulgados mostram que de fato houve uma retomada no crescimento, mas as tabelas divulgadas pelo MEC mostram que em 10 anos o crescimento do setor federal foi de 85,9%. Acontece que o setor privado cresceu 126,4% no mesmo período. Para agravar a situação o setor público estadual cresceu apenas 66,7% e o municipal 30,6%. Assim, o setor público cresceu 74%, um pouco mais da metade do que cresceu o setor privado.

Terminamos a década em situação pior do que iniciamos. Fala-se que o deputado Vanhoni (PT/PR) apresentará seu relatório no próximo dia 22.11. Certamente ele precisará escolher um caminho em relação ao perfil do acesso ao ensino superior:

1 - De um lado, a proposta do MEC de manter a mesma relação entre público e privado existente em 2010, ou seja, manter uma cobertura pública de apenas 25,8% e jogando a responsabilidade do custeio da expansão do ensino superior para os bolsos da classe média brasileira. Aliás, quando foi feita a planilha do MEC o percentual era até um pouco maior (dados de 2009);

2 – De outro lado, a sociedade civil organizada que apresentou a proposta aprovada pela CONAE segundo a qual o percentual de oferta pública deve representar 60% no decorrer da década.

A vida é feita de escolhas, relatórios também. Cabe saber a que deus o deputado pretende adorar!

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Desobediência, professores.

Após a absurda decisão de um juiz de primeira instância declarando ilegal a greve dos docentes, a imprensa paraense decidiu declarar guerra ao magistério. Em editorial publicado no jornal O liberal do dia de hoje, é exigido que os professores tenham obediência diante de decisão judicial. E mais, o editorialista se pergunta sobre o que deve ser ensinado aos alunos, pois os professores estariam estimulando a desobediência civil.

Raramente concordo com o referido jornal, mas sua direção percebeu a essência da questão que envolve o conflito entre o governo estadual, os professores e o judiciário local. Em resumo, o que está em jogo:

1. Um povo (ou uma categoria) tem o direito de se insubordinar contra ordens manifestadamente ilegais e/ou ilegítimas. Sem o exercício deste direito fundamental não teriam ocorrido às mudanças que viabilizaram a sociedade moderna. Imaginem se os franceses não tivessem exercitado a desobediência civil contra o antigo regime? E se os colonos americanos tivessem acatado as ordens da metrópole inglesa? Ou mesmo Dom Pedro tivesse acatado as ordens das Cortes portuguesas. Nossa história está permeada de desobediência. A liberdade de imprensa só foi retomada em nosso país por que muitos se levantaram contra as leis da ditadura militar.

2. No caso específico a desobediência dos professores é a melhor forma de defender duas conquistas legais. É a defesa do direito de greve, inscrito no artigo X da Constituição Federal. E a defesa da Lei Federal n° 11738 de 2008, que estabeleceu um piso salarial nacional para o magistério. E é a defesa do respeito à decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a referida lei totalmente constitucional. Ao mesmo tempo em que se insubordinam contra uma decisão de um juiz de primeira instância, os professores nos lembram que devemos exigir o respeito às leis maiores do nosso país e que todos deveriam ser iguais perante tais leis.

3. O governo do estado quer permissão para descumprir uma lei federal, para atacar o direito constitucional de greve e para tal conta com a sempre subserviente imprensa local. E todos sabem que nossa imprensa local (a nacional não está tão longe disso também!) sempre escolhe o lado que mais protege os seus interesses comerciais. Certamente o afinco atual do O Liberal se enquadra neste exemplo, afinal de contas é necessário preservar a própria sobrevivência.

Quando tinha 17 anos e estudava na Escola Estadual Pedro Amazonas Pedroso meus professores me ensinaram a importância da desobediência contra regras impostas por uma minoria. Naquela época ainda não existia o SINTEPP, mas a APEPA enfrentou a polícia comandada pelo governador Alacid Nunes. No dia 5 de setembro fui ao desfile do Dia da Pátria para apoiar os professores. A luta deles me inspirou pro resto da vida.

A greve dos professores é um exemplo de que a dignidade não tem preço e de que a luta por preservá-la sempre exige coragem e determinação.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Dois pesos e duas medidas

Nunca este ditado se aplicou tão bem a uma decisão. No dia de hoje o Juiz Elder Lisboa Ferreira da Costa, Titular da 1ª Vara de Fazenda da Capital, resolveu criminalizar o movimento grevista dos professores estaduais do Pará e, ao mesmo tempo, literalmente passar a mão na cabeça do governo estadual que teima em não cumprir a Lei do Piso.

Em sua decisão o referido Juiz determinou:

1 – O imediato retorno as atividades laborais de 100% (cem por cento) dos professores públicos estaduais sob pena de ser declarada ilegal a greve.

2 – Que o Estado do Pará não desconte os dias paralisados dos professores grevistas, e se o fez, que se devolva àqueles que sofreram descontos no pagamento vindouro.

3 – Que o Estado do Pará que adote todas as providências necessárias para a atualização do piso salarial devido aos professores conforme os termos da lei e decisão do STF, bem como a implantação do PCCR da categoria em até 12 (doze) meses, com termo inicial a partir de 01 de janeiro de 2012.

4 – Que o SINTEPP apresente, no prazo de 10 dias, o calendário que garanta a reposição das aulas perdidas.

5 – Que o Estado do Pará inicie Processo Administrativo Disciplinar aos professores que insistirem no movimento grevista.
6. Que seja cobrado em caso de descumprimento desta ordem judicial, R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) a titulo de multa por cada dia de descumprimento, a ser pago não pelos cofres do Sindicato réu, e sim, pelo seu presidente.

Resumindo a posição do Juiz:

a) Os professores devem se conformar com o descumprimento da Lei Federal do Piso e devem retornar ao trabalho imediatamente. Caso insistam em lutar pelos seus direitos o Estado deve processá-los e a presidente do SINTEPP deve pagar 25 mil reais por dia de paralisação após a decisão de hoje.

b) O Estado tem doze meses a contar de 1° de janeiro de 2012 para cumprir a lei do piso e a lei do plano de carreira estadual. E caso, mesmo tendo 14 meses para cumprir uma lei de 2008 o que acontecerá com o governo do Estado? Absolutamente nada!

Em minha humilde opinião esta decisão afronta tudo que conheço de direito em nosso país. Ficou claro nessa decisão que prevaleceu uma visão preconceituosa sobre o legítimo e constitucional direito de greve e, ao mesmo tempo, um Juiz de uma instância inferior pretende legalizar o descumprimento de uma lei federal e uma decisão expressa do Supremo Tribunal Federal.

Não sou advogado, mas me parece um caso típico de abuso de autoridade. Um Juiz de primeira instância autorizar um governo estadual a descumprir uma lei federal durante 14 meses (no limite) é um completo absurdo!

E mais, a decisão de orientar o governo do estado a abrir Processo Administrativo Disciplinar é outra extrapolação de sua autoridade.

E também inovou ao determinar que quem paga a multa fosse a presidente do Sindicato. Bem, sendo professora estadual e recebendo menos do que o piso salarial nacional, certamente terá que penhorar todos os poucos bens que uma professora honesta deve ter conseguido acumular na sua vida.

Ninguém está acima da lei, inclusive um Juiz de Primeira instância.

Não sei como a categoria dos professores vai reagir diante de tão grande injustiça, mas aceitar o mal calado não é uma postura digna de educadores.

DRU até 2015?

A presidenta Dilma Rousseff encaminhou à Câmara a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 61/11, que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 31 de dezembro de 2015. O mecanismo permite que o governo use como quiser 20% da arrecadação de todos os tributos existentes ou que vierem a ser instituídos durante o prazo de vigência, mesmo os que tiverem vinculação constitucional.

O texto enviado pelo Executivo é semelhante ao que está em vigor na Constituição (art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) e que expira em 31 de dezembro deste ano.

O governo federal argumenta que a DRU é um “instrumento de racionalização da gestão orçamentária”, possibilitando ao Executivo contornar parte da rigidez do orçamento federal. O governo alega que o mecanismo permite uma melhor distribuição dos recursos federais, principalmente diante de um cenário de grandes investimentos para preparar o País para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. A mensagem do Executivo diz ainda que a DRU não afeta o equilíbrio das contas fiscais.

Mas para onde vai o dinheiro desviado das áreas sociais pela DRU? Para o pagamento dos juros e amortização da dívida pública. No fundo, as sucessivas prorrogações deste mecanismo é uma exigência da política de ajuste fiscal, que se tornou quase uma cláusula pétrea da legislação brasileira.

A desvinculação surgiu em 1994, no Governo Itamar Franco, com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE). No Governo FHC, seu nome foi alterado para Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), em vigor entre 1996 a 1999. A partir daí, o instrumento foi sucessivamente prorrogado, já com o nome de DRU. A última ocorreu em 2007, já no Governo Lula, quando foi aprovada a Emenda Constitucional 57.

A emenda 59 retirou a educação dos efeitos da DRU. Por isso a PEC preserva os recursos vinculados à educação, que não vão ser incorporados à DRU. A Constituição determina que 18% do total de recursos arrecadados com impostos federais sejam destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino. Também ficam de fora da DRU as transferências constitucionais aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios oriundas de repartição de receitas, como os fundos de participação dos estados (FPE) e municípios (FPM).

Infelizmente é fácil prever o resultado da votação na Câmara e no Senado. Da última vez que a DRU foi prorrogada a sua votação esteve atrelada a manutenção da CPMF. Acompanhei a votação no Senado e ela foi sintomática da semelhança programática entre governo e oposição conservadora. Por acordo político, foi preservada a DRU e apenas retirada a CPMF. Cada vez mais a oposição ao governo se resume ao PSOL e há um punhado de parlamentares de esquerda que de vez em quando contrariam a orientação do governo. E só!

Apesar de atingir diretamente várias áreas sociais é praticamente imperceptível a pressão das maiores centrais sindicais e direções dos principais movimentos sociais.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Lucro líquido: para onde vai?

Hoje os portais e jornais noticiam que o Banco do Brasil anunciou nesta manhã de quinta-feira (3) ter registrado lucro líquido de R$ 2,9 bilhões no terceiro trimestre. No mesmo período de 2010, foi verificado lucro líquido de R$ 2,625 bilhões. No ano, até setembro, a instituição registrou lucro líquido de R$ 9,154 bilhões - 18,9% acima verificado no mesmo período de 2010.

Como brasileiro é normal ter orgulho do sucesso de empresas brasileiras, especialmente de empresas estatais. Porém, neste caso, vale perguntar sobre o destino destes recursos seguidamente anunciados.

Segundo o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão existem 111 empresas estatais federais no Brasil. Este número, na verdade, é um pouco menor, por que no caso da Petrobrás são contabilizadas 12 empresas e o Banco do Brasil são 10 empresas. De qualquer forma as cinco empresas principais são a Petrobrás, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, O BNDES e a Eletrobrás.

O lucro líquido das cinco principais empresas foi de R$ 62,8 bilhões em 2010. Tudo indica que este valor seja ainda maior em 2011. Daí a importância da pergunta. É verdade que nem todo lucro de uma estatal está disponível para aplicação pública. Uma parte vai para acionistas privados, outra parte é reinvestida na própria atividade da empresa. Mas uma grande parte é entregue ao Tesouro Nacional na forma de dividendos. Em 2010 o governo federal recebeu R$ 32 bilhões de dividendos.

E o que o governo federal fez com este recurso que foi quatro vezes maior do à complementação da União para o Fundeb deste ano? A resposta é, ao mesmo tempo, simples e cruel: aplicou todo no pagamento da dívida pública. A Lei nº 9530 de 1997, estabeleceu no seu inciso I do artigo 1º que todo dividendo auferido pelo governo federal devesse ser utilizado na amortização da dívida pública federal. Ou seja, a prioridade do governo é honrar os compromissos com os credores privados.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação sugeriu uma emenda com o seguinte teor:

Criar, no prazo de dois anos contado da aprovação desta Lei, o Fundo de Investimentos na Infra-Estrutura Escolar da Educação Básica Pública. Este fundo deverá ser gerido pelo Ministério da Educação na forma de um mecanismo de transferências diretas a estados e municípios que priorize os fundos estaduais do Fundeb que apresentem menor custo-aluno/ano. Este novo Fundo deverá ser composto pela destinação de 5% do lucro líquido das empresas estatais federais e seu montante deverá ser adicional a todas as transferências obrigatórias e voluntárias empreendidas pela União, configurando-se em um recurso efetivamente novo e promotor de equidade em termos de oferta de insumos educacionais.

A Senadora Marinor Brito (PSOL-PA) apresentou o Projeto de Lei do Senado nº 528/2011 visando tornar realidade a proposta da Campanha, alterando a Lei nº 9530 de 1997.

Além de lucrar é preciso discutir quem se apropria deste resultado positivo.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

O piso e a greve do Pará

A intransigência do governo do Estado do Pará é a principal causa da continuidade da greve dos trabalhadores em educação.

O governo do Estado do Pará afirma que não pode pagar o piso salarial de R$ 1187,00. Quer parcelar em infinitas parcelas a dívida deste ano. E condiciona o cumprimento da lei ao recebimento de apoio financeiro do governo federal.

Por solicitação do Sintepp, do qual tive a honra de fazer parte e dirigir em décadas passadas, realizei minucioso estudo sobre a situação financeira do Estado, sobre o pedido que o mesmo enviou ao MEC e sobre o impacto do piso na folha e nas finanças municipais.

Em resumo:

1. Caso o governo do estado resolva cumprir a lei n° 11738/08 e pague o piso retroativo a janeiro, a folha salarial do magistério consumirá 75,6% do recurso mínimo obrigatório para aplicação em manutenção e desenvolvimento do ensino;

2. Caso o governo pague o piso a partir de setembro e negocie o retroativo para mais adiante, este impacto cairia para 68,7% do total do MDE;

3. De nenhuma forma o cumprimento do piso colocará em risco o equilíbrio fiscal estadual. Até agosto o gasto com pessoal era de apenas 43,6%, muito longe dos 49% máximos estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal;

4. Para atingir 49% seria necessário agregar ao gasto com pessoal algo em torno de 500 milhões, mas o pedido de complementação feito ao MEC é de 195 milhões, ou seja, o governo pode acrescer recursos próprios para pagar o piso e isso não provoca desequilíbrio fiscal no Estado do Pará.

Por isso, a pergunta que mais ouço dos educadores é POR QUE então o governo continua intransigente. Tenho a seguinte avaliação:

1. Acho que o governador pretende alcançar três objetivos simultâneos com esta postura: derrotar a organização sindical dos professores, não precisar mexer nas suas outras prioridades políticas para ter que pagar o piso este ano e, mais importante, criar uma situação que não ocorram grandes mobilizações quando ele resolver não pagar o piso o ano que vem.

2. Ano que vem o piso será de pelo menos R$ 1450,86, ou seja, 22% maior do que o atual. Ele vende dificuldades inexistentes em 2011 para criar um clima que justifique pagar salários ainda mais distantes em 2012.

A greve do Pará, assim como todas as greves que ocorrem e ocorreram no Brasil inteiro são decisivas para que a lei do piso não se torne letra morta. Acho até que está fazendo falta uma ação mais unitária da categoria. Sei que no último dia 26 de outubro houve uma marcha em Brasília, eu estive lá, mas um ou dois dias de paralisação nacional talvez fossem necessários, tipo uma demonstração de força de uma categoria de 2 milhões de membros.

Plebiscito

Enquanto todos estão aguardando ansiosamente pelo Relatório do deputado Ângelo Vanhoni, cresce a disposição de luta da sociedade civil pelos 10% do PIB pra educação pública.

Polêmicas e fragmentações à parte é sensível o crescimento da luta por um percentual maior de recursos para a educação no novo Plano Nacional de Educação.

Quero hoje destacar a iniciativa da Campanha Nacional pelos 10% do PIB para Educação Pública Já, coordenada pela CSP-Conlutas, Intersindical, Andes-SN e Sinasefe e outras entidades.

Esta articulação estará promovendo um plebiscito nacional, no qual se perguntará ao povo brasileiro se concorda com a destinação de 10% do PIB para a educação.

A sociedade civil já utilizou esta ferramenta de mobilização outras vezes, sendo a mais memorável o plebiscito contra a adesão do Brasil ao Acordo de livre Comércio das Américas – ALCA, que felizmente foi abandonado após intensa resistência em todo o continente.

Certamente colher votos para um tema mais próximo do cotidiano das pessoas será mais fácil. Porém, realizar um plebiscito representativo e em todo o país não é tarefa simples. Alcançar um grande número de cidades exige um bom nível de organização.
Tenho participado de todas as atividades e apoiado todas as iniciativas que fortalecem a luta por mais recursos para a educação e por um PNE que espelhe os interesses da maioria do nosso povo. Ajudei na elaboração das emendas da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, ajudei na análise das planilhas do MEC e na elaboração da nota técnica que desconstruiu o discurso de que 7% eram suficientes, fui ao ato da UNE, participei da marcha da CNTE e, com toda certeza, dentro das minhas possibilidades, ajudarei na realização do plebiscito pelos 10% do PIB.

Acho que está na hora de aumentarmos a nossa disposição para a realização de ações unitárias, massivas e nacionais. O atraso na apresentação do relatório é um mau sinal e somente muita pressão social conseguirá influenciar numa decisão favorável no parlamento.

Então, convido todos os que defendem um PNE pra valer e mais recursos para a educação para ajudarem na realização do plebiscito. Ele está previsto para acontecer entre 6 de novembro e 6 de dezembro.