Volto a discutir o absurdo metodológico que representa usar
o valor por aluno do Fundeb como parâmetro para o debate sobre o Custo
Aluno-Qualidade Inicial. Recordo que regulamentar o CAQi é uma obrigação legal
(prazo de dois anos para implementar, conforme o PNE).
Relembrando:
1.
O valor por aluno do Fundeb é produto de uma
equação bastante simples: divido o dinheiro bloqueado pelo fundo (menos do que
o dinheiro obrigatório de ser aplicado em educação e menor do que o recurso
disponível efetivamente) pelo número de alunos de diferentes etapas e
modalidades. Encontro um valor médio, o qual é denominado de Valor por Aluno
Estadual, posto que tal divisão é feita em cada estado.
2.
Os fatores de ponderação de cada etapa e
modalidade nesta divisão descrita acima são arbitrários, não foram fruto de
nenhum levantamento científico. As mesmas somente podem variar 30% para cima e
30% para baixo do Valor por aluno das séries iniciais do Ensino Fundamental. Não
há estudo oficial sobre o tema e o intervalo contraria fatores encontrados em
estudos feitos por diferentes pesquisadores.
3.
Assim, o Valor por Aluno de cada fundo estadual
não é nem o que efetivamente cada município (ou estado) aplica naquela etapa ou
modalidade, nem é o valor real da referida etapa. É uma conta de chegada,
limitada pelas regras artificiais estabelecida.
4.
O Valor por Aluno dos fundos estaduais mais
pobres são ajudados com recursos federais (Complementação da União). Esta
contribuição não leva em consideração nenhum patamar de qualidade acordado, se
baseia no quanto de aumento o montante estabelecido pela regra permite subir o
valor por aluno de cada fundo. Assim, o fundo estadual do Maranhão, por
exemplo, com seus recursos próprios chega a uma per capita de R$ 1253,96 para o
ano de 2014. Com a ajuda da União é possível chegar a R$ 2285,57. Qual o
critério usado para chegar neste patamar? Uma equação matemática redistributiva
entre os fundos mais pobres, começando pelo Maranhão. Ao invés de R$ 104,49
reais por mês conseguiu-se oferecer R$ 190,46. Foi feito algum cálculo para
verificar se este novo valor é suficiente para prover os insumos básicos para o
funcionamento das escolas no Maranhão? Não. Foi feito um cálculo pelo menos
para verificar que com este novo valor o piso dos professores seria pago em
todos os municípios maranhenses? Também não.
Por esta breve explicação já dá para perceber que em termos
metodológicos, o FUNDEB não leva em consideração “os respectivos insumos
indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem”, como na estratégia 20.6
está dito que será o parâmetro para construir O Custo Aluno-Qualidade Inicial.
E mais, na Estratégia 20.7 é explicitado o entendimento de que fatores devem
ser arrolados: “investimentos em qualificação e remuneração do pessoal docente
e dos demais profissionais da educação pública, em aquisição, manutenção,
construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino e
em aquisição de material didático-escolar, alimentação e transporte escolar”.
Trabalhar com os atuais valores do FUNDEB é, obviamente, partir de uma base
pantanosa, imprecisa, para materializar algo que a legislação pede que seja
concreto, que parta de custos efetivos (mesmo que médios) de um conjunto de
insumos necessários para garantir um funcionamento aceitável de nossas escolas.
Ao contrário da dinâmica do FUNDEB (valor baseado em quanto
meu dinheiro oferece em termos de percapita diante da quantidade de alunos que
tenho na minha rede escolar), a matriz do Custo Aluno Qualidade parte de outro
caminho metodológico. Vejamos:
1.
Ela foi construída pela Campanha Nacional pelo
Direito à Educação (ver Carreira e Pinto, 2007), aceita pela Conferência
Nacional de Educação de 2010, depois incorporada pela Câmara de Educação Básica
do Conselho Nacional de Educação (em resolução nunca homologada pelo MEC e que
dorme numa gaveta desde 2010) e finalmente incorporada na legislação nacional
(Lei nº 13005 de 2014).
2.
Parte da evidência de que uma escola de
qualidade (de dado padrão de qualidade) é composta de determinados insumos, dentre
os quais destaco a remuneração dos docentes e demais trabalhadores da educação
(qual a remuneração aceitável para construir o padrão); as condições de oferta
(prédio, ambientes, espaços pedagógicos, espaços esportivos, etc.); o tamanho
das turmas (essencial para evitar piora das condições de trabalho e de
aprendizado) e o tamanho das escolas (essencial para facilitar a gestão).
3.
Foram construídas escolas ideais (no sentido de
padrão) e inseridos nela todos os insumos nos padrões estabelecidos. Após esse
procedimento foi aferido o Custo Aluno de cada etapa e modalidade. Ou seja, o
Custo Aluno não é uma média ou um acerto entre dinheiro disponível e número de
alunos. É o produto do custo dos insumos necessários a dotar a escola de condições
de qualidade aceitáveis dividido pelo número de alunos.
A lógica do CAQi representa uma ruptura com a lógica atual
do financiamento da educação básica. Ao invés de estabelecer um valor por aluno
com parte dos recursos obrigatórios e complementar os mais carentes neste
parâmetro, ele propõe estabelecer um padrão inicial de qualidade (inicial por
que este padrão tende a ser dinâmico na medida em que a sociedade exige mais
benefícios e garantias ou avanços tecnológicos exigem novos espaços escolares)
por etapa e modalidade e organizar o financiamento estatal visando dotar todas
as redes escolares de condições de cumprir os parâmetros, garantindo que um
aluno, independentemente do local de moradia, seja tratado como brasileiro de
pleno direito.
Espero que os esclarecimentos sucintos deste post ajudem os
membros do governo a entender o quanto é equivocado fazer um sinal de igualdade
entre FUNDEB e CAQI e o quanto é prejudicial para o estabelecimento de um
padrão mínimo de qualidade partir da lógica financeira atual.
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