Começou a circular esta semana uma versão preliminar de uma
encomenda feita pela Presidente Dilma ao seu ministro da Secretaria de Assuntos
Estratégicos, senhor Mangabeira Unger, para tirar do limbo o slogan de Pátria
Educadora. O nome do documento é “Pátria Educadora: a qualificação do ensino
básico como obra de construção nacional”.
No intervalo entre a designação da tarefa e a publicização do
documento muita água passou por debaixo da ponte, sendo relevante o fato de que
um ministro saiu e outro assumiu.
Antes de abordar o conteúdo do documento, cabe anotar uma
estranheza: por que o mesmo não foi formulado e conduzido pelo titular da
pasta? Como construir uma proposta de pátria Educadora por fora do acúmulo
teórico e institucional do Ministério responsável pela condução da política
educacional? Li que tal metodologia causou constrangimento, mas não sei
mensurar a extensão dela.
Este primeiro post ainda não entrará no debate do mérito do
documento, mas destacarei dois aspectos que julgo relevantes do seu conteúdo.
O primeiro é uma certa arrogância explícita no texto. Em dado
momento o autor lembra que em alguns países de nossa região tivemos figuras
políticas que marcaram uma virada educacional e de desenvolvimento, cita que
este foi o caso de Domingos Sarmiento na
Argentina (no século 19) e no século 20 o de José Vasconcelos no México. Q
afirma que no Brasil, “Anísio Teixeira foi quem mais se aproximou deste papel,
embora tenha ficado longe de exercer influência da dimensão destes inovadores”.
Guardadas as realidades históricas distintas, é verdade que mudanças políticas
e econômicas podem ser personalizadas, mesmo que fruto de sua época. É certo
também que há consenso na importância do Manifesto dos Pioneiros e da liderança
de Anísio Teixeira para o processo educacional brasileiro.
Porém, de que personalidade o
autor está se referindo? Ele considera que Dilma Rousseff possui as condições
políticas de liderar um projeto de nação ancorado na educação? Ou estará
falando dele próprio, talvez empolgado com a tarefa que recebeu?
O segundo aspecto aparece quase ao final do texto. Tentando responder a
pergunta essencial de como será construída a pátria educadora,
o ilustre ministro afirma que isso será feito avançando “simultaneamente em
três planos. O primeiro plano é construção de um ideário. É o que esta primeira
parte do texto começa a esboçar. O segundo plano é série de ações a serem
lançadas, em rápida sucessão, a partir do lançamento da Pátria Educadora. É o
que está resumido, em forma de elenco de medidas, na segunda parte desta
minuta. O terceiro plano é consulta ampla dos interessados em todo o país” (p.
21).
Quando os
leitores atentos aguardavam a exposição de uma metodologia de consulta sobre as
ideias expostas no documento, ou pelo menos a apresentação de uma lista de
atores sociais e institucionais essenciais para a construção de uma pátria
educadora, o senhor Unger afirma que tal proposta terá “críticos e
eventualmente adversários”, mas que já “começa a configurar-se, entretanto, a
aliança amplamente majoritária -- política, social, e intelectual -- capaz de
sustentar este projeto”.
Quem foi
consultado previamente para a elaboração das propostas apresentadas? A resposta
desta pergunta é muito relevante, por que informa que atores sociais são
considerados essenciais para o responsável pela tarefa (e para a Presidência da
República). Ao afirmar que começa a configurar-se um a aliança amplamente
majoritária, ou seja, um conjunto de forças políticas e sociais defensoras das
ideias apresentadas, o autor induz seus leitores a imaginar inúmeras consultas
e costuras feitas.
A encomenda
ao Mangabeira Unger é simbólica de uma mudança radical de eixo de formulação e
de base social do petismo no governo. Mudaram não somente as práticas, mas
também os segmentos sociais para quem se faz política e a quem se escuta antes
de propor.
No final do
ano passado foi realizada a segunda Conferência Nacional de Educação, reunindo
as energias vivas na área da educação (não todas, mas foi bastante
representativa de quem discute, formula e pratica a educação pública no país),
mas parece que não são destas energias criativas que o ministro de assuntos
estratégicos se refere várias vezes no documento.
Em que pese
as observações preliminares que faço, não acho que o documento deva ser
desconsiderado, pelo menos pelos seguintes motivos:
1.
O documento, mesmo que preliminar, é a
primeira proposta mais elaborada de política educacional desde que o PT chegou
ao governo, mesmo que bem longe da tradição anterior deste partido;
2.
A encomenda, mesmo que passando por fora
do MEC, foi feita pela presidente Dilma, a qual precisa criar fatos políticos
favoráveis na mesma proporção que os seres humanos precisam de ar para viver,
ou seja, muito do seu conteúdo pode se tornar políticas públicas; e
3.
Uma análise do seu conteúdo pode ajudar
a entender os pressupostos teóricos e políticos que orientarão as políticas
educacionais no atual governo.
No próximo
post vou refletir sobre as principais ideais apresentadas no documento.
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