quarta-feira, 24 de junho de 2015

Um ano de PNE: Falta dinheiro para todos?

Começo a publicar hoje uma série de comentários sobre o primeiro ano de vigência do Plano Nacional de Educação. A Lei 13.005 completa seu primeiro aniversário neste 24 de junho.
Hoje vou comentar as condições para que o PNE comece a sair do papel e aproveito uma frase do ministro da Educação, professor Janine Ribeiro, em entrevista publicada no portal UOL:
"Veja, existe uma crise econômica no país. A economia está passando por um momento difícil, vai se recuperar, mas agora está falando dinheiro para todos. Neste momento, nós temos que construir a forma de superação disso para quando melhorar a economia do país".
O primeiro ano do PNE foi marcado por alguns elementos conjunturais que precisam ser sistematizados:
1.      Metade do primeiro ano o país esteve envolvido no processo eleitoral, um dos mais disputados de nossa história recente. Mesmo assim, a educação apareceu em inúmeras campanhas como algo relevante para o desenvolvimento do país. A vencedora do pleito federal, Dilma Rousseff, ancorou parte do discurso de permanência no cargo nos feitos na área educacional, mesmo que tenha pinçado justamente os programas direcionados a subsidiar a oferta privada de educação (FIES e Pronatec).
2.      Ao tomar posse, a presidenta reeleita apresentou a educação como a “prioridade das prioridades” e elegeu o mote de seu segundo mandato como “Pátria Educadora”. A sinalização era clara: a área educacional teria um peso importante na alocação de recursos e nas preocupações governamentais.
3.      Antes mesmo da posse, porém, a composição dos ministérios e as medidas econômicas apontavam para direção totalmente oposta. Houve um reconhecimento de que a crise econômica era mais grave do que se falava na campanha, que seriam necessários ajustes fiscais, os quais consistiriam em corte de direitos trabalhistas, corte de isenções de impostos concedidos anteriormente ao setor industrial e cortes profundos no Orçamento Federal, tudo isso em um esforço para retomar a confiança do “mercado” em um governo envolto em uma crise política (Operação Lava Jato, manifestações de rua e infidelidade da base parlamentar).
Um Plano educacional é, antes de tudo, um compromisso que o Estado Brasileiro assume por dez anos de melhorar a educação. Isto significa que serão desenvolvidos esforços para superar entraves, sejam eles pedagógicos, materiais, salariais ou de formação de mão-de-obra. Tais desafios estão expressos (com suas contradições) no PNE vigente. Porém, tais compromissos precisam de pelo menos três pressupostos para sair do papel:
1.      Que o governo federal e os governos estaduais e municipais reorganizem seus orçamentos anuais, durante uma década, para prover de recursos as políticas necessárias ao cumprimento das metas;
2.      Que a União cumpra seu papel de coordenadora do esforço nacional, desenvolvendo tarefas redistributivas, supletivas e de apoio técnico. E também induza comportamentos positivos, seja por meio de programas federais, seja pelo próprio exemplo.
3.      Que sejam criadas as condições normativas e operacionais para que as metas saiam do papel e que possam ser fiscalizadas pela sociedade civil e por toda a população.
A frase do ministro aborda o problema central (mesmo que não o único) que levou a termos perdido o primeiro ano de vigência do PNE. A lógica do governo federal, seguida por quase todos os governos estaduais e municipais, tem sido de fazer ajustes nas contas públicas retirando direitos e cortando despesas de custeio e investimento nas áreas sociais. Tal postura inviabiliza qualquer debate sério sobre o cumprimento das metas do novo plano.
Na referida entrevista, o ministro afirma que o motivo do atraso da aprovação de planos estaduais e municipais (hoje esgota o prazo) é por que a “questão de gênero” ocupou um papel preponderante e acabou atrasando a aprovação das normas. Isso não é plenamente verdadeiro. Não que a reação conservadora (crescente no país) não tenha contaminado muitos debates de planos estaduais e municipais, complicando a discussão nas casas legislativas, mas a crise econômica é o principal fundamento para tornar tímido cada governo estadual e municipal a enviar para o legislativo um conjunto de compromissos, os quais os governantes consideram “fora da realidade” de ajustes que estão sendo feitos.
Vejamos o que aconteceu nos estados e municípios no primeiro semestre de 2015. Em várias redes estaduais e municipais os docentes realizaram longas greves, todas elas tentando impedir retirada de direitos (previdenciários por exemplo) ou exigindo o cumprimento do piso salarial nacional.
No âmbito federal, o governo anunciou um corte de 9,4 bilhões de reais no Orçamento do MEC, as universidades estão parando por falta de recursos para custear atividades essenciais, programas importantes para o cumprimento do PNE (como o Programa de Iniciação à Docência – PIBID) estão sendo cortados (não foram julgados estratégicos pelo MEC e assim ficaram desprotegidos dos cortes), os técnicos das universidades estão em greve (por que reajuste salarial não está na pauta governamental para este ano e quem sabe o próximo também), os professores universitários, pelo menos na maioria das instituições, também paralisaram por motivos semelhantes.
Ao contrário do que a fala do ministro sugere, em uma crise econômica há uma intensificação da disputa pelo fundo público. E está muito evidente de que o empresariado não só tem melhores instrumentos para minimizar os efeitos da crise, como encontra um governo disposto a fazer sempre mais concessões aos seus interesses. A crise tem afetado diretamente os assalariados, os de emprego precário e os jovens sem emprego. Estes não estão sendo protegidos pelo governo.
Na educação, infelizmente, a pressão do empresariado por abertura de novos espaços de negócios tem sido atendida pelo governo. E quando os cortes orçamentários provocam diminuição de investimentos em áreas dos seus interesses, o empresariado chia, consegue espaço na mídia e o governo recua. Basta ver como rapidamente foram resolvidos os problemas com o FIES e PRONATEC. Nestes casos, juntou a fome (interesse do governo de oferecer vagas mais baratas em áreas com baixa cobertura) com a vontade de comer (interesse do empresariado em abocanhar novos mercados).



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