quinta-feira, 25 de junho de 2015

O que poderia ter sido feito no primeiro ano do PNE

Vamos considerar a tese do Ministro da Educação de que pouco foi feito por que está faltando dinheiro para todos (ontem mostrei que existiram escolhas governamentais sobre onde alocar recursos do fundo público em meio à crise econômica, faltando dinheiro para uns e preservando recursos para outros). Será que poderia ter sido feito mais pelo PNE do que foi feito (bem, como praticamente nada foi feito, qualquer coisa seria bem mais!)?
O PNE é um plano de dez anos, mas algumas metas e determinações da lei possuem prazo de apenas dois anos, ou seja, caso nada tenha sido feito sobre essas determinações, simplesmente perdemos um ano de vigência. E nem tudo envolve dinheiro (posto que o mesmo estaria faltando para todos). Vejamos:
O artigo 4º da Lei afirma que as metas “deverão ter como referência a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD, o censo demográfico e os censos nacionais da educação básica e superior mais atualizados” e que o Poder Público “buscará ampliar o escopo das pesquisas com fins estatísticos de forma a incluir informação detalhada sobre o perfil das populações de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência”. No primeiro ano do PNE, vale perguntar quais providências técnicas foram tomadas para cumprir esta tarefa?
No parágrafo 2º do artigo 5º ficou estabelecido que a cada dois anos, o INEP publicaria “estudos para aferir a evolução no cumprimento das metas estabelecidas no Anexo desta Lei, com informações organizadas por ente federado e consolidadas em âmbito nacional”. Tendo se esgotado metade do prazo para divulgação do primeiro relatório, eu pergunto sobre quais providências técnicas foram tomadas pelo INEP?
No mesmo artigo, no seu parágrafo 5º, a Lei estabelece que a parcela da participação no resultado ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e de gás natural será destinada à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, em acréscimo aos recursos vinculados nos termos do art. 212 da Constituição Federal. Tal providência precisaria de lei específica. É forçoso perguntar: por que até o momento não foram tomadas providências para regulamentar o uso dos recursos dos royalties para a educação, especialmente a parcela federal dos mesmos? A omissão governamental induz uma conclusão de que tais recursos, sem regulamentação, poderão enquanto isso serem destinados a engrossar o “esforço fiscal do governo” e migrar para os bolsos dos credores da dívida pública.
Um dos avanços do PNE foi o teor do seu artigo 7º. No parágrafo 5º é dito que “Será criada uma instância permanente de negociação e cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios”. O que falta para cumprir esta norma, posto que a mesma não custa um centavo para os cofres federais?
A única providência lembrada pela propaganda federal é justamente a que não depende de iniciativas deste ente. Falo do artigo 8º, que dá prazo de um ano para que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios elaborarem seus correspondentes planos de educação, ou adequem os planos já aprovados em lei. O prazo se encerrou ontem e o dado fornecido pelo MEC era, no mínimo, preocupante.
No seu artigo 13, outro avanço importante. No prazo de dois anos, o poder público deverá instituir, em lei específica, “o Sistema Nacional de Educação, responsável pela articulação entre os sistemas de ensino, em regime de colaboração, para efetivação das diretrizes, metas e estratégias do Plano Nacional de Educação”. Seria bom informar para a sociedade brasileira qual o teor da minuta de lei do sistema (caso exista) e informar quando o projeto de lei será enviado para o Congresso, especialmente considerando o ritmo daquela Casa para aprovar leis benéficas ao povo brasileiro (todos os dias presenciamos o ritmo alucinante para aprovar as leis maléficas).
Se no geral as metas possuem prazos decenais, algumas metas e estratégias possuem prazo também de dois anos, ou seja, já perdemos metade do prazo sem que providências fossem tomadas. Destaco algumas:
Na Meta 1, temos o prazo até 2016 (faltam na verdade seis meses) para universalizar a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade.
Na Meta 3, também temos o prazo de universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos.
Na estratégia 7.21 ficou estabelecido que “a União, em regime de colaboração com os entes federados subnacionais”, deveria estabelecer, no prazo de 2 (dois) anos contados da publicação desta Lei, “parâmetros mínimos de qualidade dos serviços da educação básica, a serem utilizados como referência para infraestrutura das escolas, recursos pedagógicos, entre outros insumos relevantes, bem como instrumento para adoção de medidas para a melhoria da qualidade do ensino”. Quais providências foram tomadas para cumprir esta estratégia? Existe grupo de trabalho que respeite o regime de colaboração ou teremos a antiga prática de pacotes federais sem debate com os demais entes?
A estratégia 12.19, trata da tarefa de “reestruturar com ênfase na melhoria de prazos e qualidade da decisão”, também no prazo de 2 (dois) anos, “os procedimentos adotados na área de avaliação, regulação e supervisão, em relação aos processos de autorização de cursos e instituições, de reconhecimento ou renovação de reconhecimento de cursos superiores e de credenciamento ou recredenciamento de instituições, no âmbito do sistema federal de ensino”. Regular o setor privado, é disto que se trata. Quais providências foram tomadas para cumprir este importante dispositivo? Aqui também seria possível com os recursos correntes e pessoal existente nas secretarias do MEC realizar a tarefa, independente de cortes orçamentários.
Um dos dispositivos mais polêmicos do PNE e que tem a capacidade de provocar impactos positivos na qualidade do ensino é, sem sombra de dúvida, a implantação do Custo Aluno-Qualidade Inicial – CAQi. O prazo, estabelecido pela estratégia 20.6 é de dois anos. Neste caso, vale registrar, que o MEC tomou uma providência parcial. Por portaria foi constituído um grupo de trabalho interno ao MEC, sem participação dos demais entes federados (aos quais o CAQi é destinado) e sem participação da sociedade civil (principal interessada na efetivação da medida e que foi decisiva para a sua formulação e que garantiu sua presença na lei). Quando os principais atores sociais educacionais serão ouvidos? Qual prazo para apresentar o projeto de regulamentação, posto que dois anos é o prazo para a sua implantação?
Poderia ainda citar as metas 18 e 19, ou mesmo a estratégia 20.9 (que trata da regulamentação, por lei federal, do parágrafo único do artigo 23 da CF). Mas a lista acima já é suficiente para demonstrar que a crise econômica não é explicação suficiente para entender o motivo de que NADA ou QUASE NADA foi feito pelo Plano Nacional de Educação no seu primeiro ano de existência.
Estamos correndo o risco de repetir a trajetória no PNE anterior: aprovar uma lei que o governo federal e os governos estaduais e municipais fazem de conta que não existe.
Assim como para sua aprovação foi necessária forte mobilização social, para a sua efetivação muitas lutas precisarão ser travadas. Somente é possível cumprir e efetivar o PNE se a educação realmente (nos fatos e não nos discursos) se tornar a “prioridade das prioridades”.



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