Em tempos idos Maquiavel
aconselhou os governantes de sua época a fazerem o mal de uma vez só e o bem
deveria ser feito a conta gotas. A ideia era diminuir as resistências quando
precisassem aplicar medidas impopulares e render ao máximo os efeitos de
medidas positivas.
Quando sai do plenário do Senado
Federal ontem a noite, após o adiamento da votação do plano Nacional de Educação
para a próxima terça-feira (17 de dezembro), fiquei com a impressão de que o
governo e sua base parlamentar tenta reinventar o conselho do Maquiavel, pois
na tramitação do Senado o mal tem sido feito a conta gotas e o bem está difícil
de encontrar pelo menos uma gotícula sequer.
É preciso explicar em primeiro
lugar por que não foi votado no dia de ontem. De forma sintética e relatando um
pouco dos bastidores o que aconteceu foi o seguinte:
1. Estava escrito nas estrelas
que o governo usaria a sua folgada maioria para rejeitar o Substitutivo
aprovado na Comissão de Educação. Para isso foi apresentada uma Emenda
Substitutiva de Plenário, assinada pelo senador Vital do Rego, que retomava
basicamente o texto aprovado na CCJ, recuando na supressão dos prazos e
incorporando mudanças feitas na Comissão de Educação, mas que não eram
vinculadas nem a aumento de recursos, nem a maior responsabilização da União no
cumprimento das metas e estratégias.
2. Durante a tarde começou a ser
costurado um acordo entre governo (PT/PMDB) e o PSDB. Basicamente o acordo
significava um recuo do relator da CE, senador Álvaro Dias, que aceitaria os
principais pontos da Emenda de Plenário e, em troca, seria o relator de plenário.
Para os interesses dos que lutam por um PNE pra Valer o referido acordo era
desastroso, retirando todos os pontos retomados na CE e que estavam presentes
no texto aprovado na Câmara.
3. Estava claro que o interesse
do governo era, essencialmente, garantir no texto a destinação de recursos públicos
para o setor privado (especialmente para Pronatec, Prouni e Fies), retirar toda
referência a amaldiçoada palavra "pública", retirar percentual de
crescimento público na Meta 11 (ensino profissionalizante) e Meta 12 (ensino
superior) e retirar a possibilidade de que a União complemente o Custo Aluno
Qualidade no futuro.
4. Presenciei o diálogo do senador
Álvaro Dias (PSDB/PR) e do senador Randolfe Rodrigues (PSOL/AP). Seu relato
envergonhado do acordo firmado foi esclarecedor do texto que viria. Depois
presenciei a pressão do senador do PSOL (pré-candidato a presidente) sobre o
senador Aécio Neves (pré-candidato também) para que o acordo fosse desfeito. Não
sei se foi isso que determinou, mas o fato é que o PSDB mudou de ideia e desfez
o acordo.
5. Foi nomeado o senador Eduardo
Braga (PMDB/AM), líder do governo, para relatar a matéria e como previsto,
acatou a Emenda governista, introduzindo algumas pequenas modificações (para não
dizer que não mudou nada). Basicamente o relator pediu pra que seja aprovado a
Emenda n] 04, apresentada pelo senador Vital do Rego, cujos pontos principais já
comentei anteriormente - Governa
vai jogar pesado (e contra o povo),
6. O texto governista só não foi
votado ontem por que havia sido marcada uma confraternização entre os
senadores, promovida pelo austero Renan Calheiros e, certamente a continuidade
da votação esfriaria as iguarias do referido jantar.
Na terça-feira o governo vai
aprovar o que quer, vai enviar para a Câmara um texto pior do que recebeu.
O atraso de ontem tem um efeito
colateral imprevisível: o PNE somente será votado na Câmara no ano que vem, lá
pelos idos de fevereiro. E irá coincidir com a realização da II Conferência
Nacional de Educação, evento que irá reunir centenas de delegados eleitos em
encontros municipais e estaduais. Ou seja, a pressão contra as maldades
governamentais irá aumentar.
Da mesma forma que para Maquiavel,
o governo trata a vontade popular como um problema a ser contornado. Falta
combinar este jogo com o povo.
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