Há dezessete anos atrás eu exercia o mandato de deputado
estadual no Pará. E numa tarde recebi um telefonema de uma professora da cidade
de Eldorado de Carajás. De forma nervosa a professora relatava que vários
militantes do MST haviam sido mortos pela Polícia Militar em um trecho da
PA-150, numa localidade conhecida como Curva do S.
Na manhã seguinte cheguei a Marabá fazendo parte de uma
comitiva de deputados estaduais. Estive no local onde os corpos estavam
aguardando perícia (a cidade de Marabá não possuía área apropriada para tal
procedimento). Certamente foi uma das cenas que não se apagam da memória. Percorri
cada corpo a procura de conhecidos, pois havia participado e me pronunciado
semanas antes em manifestação promovida pelo mesmo grupo. No entanto era difícil
identificar vários deles, pois mais do que um conflito, muitos foram vítimas de
execução e tinham seus rostos deformados.
Com a referida comitiva visitei o quartel da PM de Marabá,
hospitais que socorreram feridos e mais tarde participei de audiência com o então
governador do estado, senhor Almir Gabriel (PSDB).
É interessante como determinadas atitudes se repetem. Li nos
jornais de hoje que o ex-governador paulista Luiz Antônio Fleury, em depoimento
no julgamento dos policiais responsáveis pelo Massacre de Carandiru, defendeu a
ação policial. A mesma postura teve o governador paraense dois dias após o episódio
de Eldorado dos Carajás. Depois ele jogou a culpa nos comandantes da operação,
pois tal atitude retirava dele a responsabilidade por ter autorizado a ação.
Passados dezessete anos o pano de fundo do massacre continua
sem solução, ou seja, milhões de brasileiros continuam privados do acesso à
terra e nossos governos optaram por privilegiar a grande propriedade em
detrimento da pequena produção e, por incrível que pareça, defender uma reforma
agrária virou coisa fora de moda na política nacional.
Os excluídos, sejam eles sem-terra, índios, ribeirinhos ou
pequenos produtores, teimam em não deixar o debate morrer. Ainda bem.
Ao me deslocar para o trabalho enfrentei um enorme
engarrafamento provocado por passeata do MST. A marcha tenta reacender a luta
por terra e condições de trabalho de parcela significativa dos excluídos do
modelo econômico brasileiro. A maioria dos condutores dos carros ao lado do meu
estavam revoltados com a passeata.
Eu cheguei atrasado ao trabalho, mas sei que se os excluídos
não gritarem, quem ouvirá os seus reclamos?
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