O jornal Valor publicou interessante matéria. Mais de um terço dos alunos das escolas municipais do Estado de São Paulo tem toda a política pedagógica coordenada por grandes grupos privados de educação.
A reportagem de Caio Junqueira informa que o São Paulo é o Estado com o maior índice (7%) de escolas que não recebem, gratuitamente, os livros fornecidos pelo MEC. Depois, vêm Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Paraná, com 1%. Nos demais, este índice não chega a 1%.
O jornal relata que um pacote com apostilas, programação de aulas, avaliações externas e internas, treinamento de professores e funcionários e capacitação tecnológica custa entre R$ 150 e R$ 300 por aluno, contra cerca de R$ 18 que o MEC, em média, gasta com o programa de distribuição de livros por aluno.
O Valor destaca que o uso do sistema privado de ensino rende ganhos incalculáveis em visibilidade eleitoral e informa que há inquéritos do Ministério Público apontando irregularidades nas transações e que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) publicou uma norma há dois anos obrigando os municípios a fazerem licitações para a escolha dos sistemas privados.
A matéria informa ainda que a participação destes grupos de ensino nas campanhas eleitorais chegou a R$ 185 mil em 2008, enquanto em 2004 não havia registros significativos de doações.
Como era de se esperar, o secretário de Educação do Estado de São Paulo, Paulo Renato Souza, saiu em defesa dos grupos privados e disse que "há um preconceito quando se fala da questão da apostila, como se fosse algo de menor qualidade". De acordo com ele, 95% das escolas privadas usam apostilas. "Elas trazem uma sistematização das disciplinas ao longo do ano, com encadeamento de conteúdo, treinamento de professores e acompanhamento da evolução", defende. Ele considera "defectivo" usar o termo "apostila". "São sistemas de ensino", afirmou.
A secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar, critica o sistema apostilado de ensino. "Os professores não precisam de muletas para dar aulas. Eles precisam de autonomia, não de tutela de terceiros. Não queremos um sistema rígido e reducionista como as apostilas", criticou. Ela defende aumentar a oferta de livros didáticos e programas de formação de professores. "Temos a certeza de que quanto melhor prepararmos o professor, menos ele irá aceitar a imposição das apostilas por quem quer que seja", disse.
O mais interessante na matéria foi a divulgação do brilhante trabalho de pesquisa desenvolvido pela professora doutora Thereza Adrião, da Faculdade de Educação da Unicamp, que avalia as parcerias com o setor privado na rede de ensino público paulista. Ela destaca cinco pontos prejudiciais ao uso das apostilas:
1) falta de controle social ou técnico;
2) fragilidade conceitual e pedagógica;
3) duplo pagamento pelo mesmo serviço - já que o MEC fornece materiais gratuitos;
4) vinculação do direito à qualidade de ensino submetida à lógica do lucro; e
5) padronização de conteúdos e currículos escolares como parâmetro de qualidade.
Thereza Adrião diz ainda que o uso de apostilas do sistema privado no ensino público "vem sendo utilizado como moeda eleitoral” e o material é trocado quando a oposição vence as eleições. "O que ocorre quando a oposição vence a eleição? Muda-se o material, muda-se a empresa e a possibilidade de constituição de uma política educacional afeita às necessidades do município é, em realidade, negada", afirmou a professora.